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sexta-feira, 1 de agosto de 2025

DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA: COMO, ONDE E QUANDO NASCEU A LÍNGUA PORTUGUESA? FRAGMENTO - ATALIBA T. DE CASTILHO - COM GABARITO

 Divulgação Científica: Como, onde e quando nasceu a língua portuguesa? – Fragmento

            Ataliba T. de Castilho (USP, CNPq)

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        Para saber como, onde e quando nasceu a Língua Portuguesa, precisaremos em primeiro lugar entender o que é a Europa Latina.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhWH8-7IStAW0mwItCkWDRzc3wmIQsaTozyvU2rjoxJs4Y6rdCFvHPC54IK8faUp1CBIyqp3RXVB1ctcYvRPAY8Fexm5AwKt0YnNxRbfrA1Qhmnr2nmVRcZ-TEJHksjPQAFWgLEFkwnGOcG4tXdo2Ffy6vVDhA-aoxVz92Z34iSbYMz9KId-molIT4uRss/s320/maxresdefault.jpg


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        Tópico 1

        Pra começo de conversa, você sabia que existe a América Latina, mas sabia também que existe uma Europa Latina? Pois é, além de América Latina também existe uma Europa Latina. É isso mesmo, só que ao contrário. É porque existiu uma Europa Latina que temos hoje uma América Latina, onde se falam o Português, o Espanhol e o Francês, trazidos pelos colonizadores.

        A Europa Latina é a parte europeia do que sobrou do Império Romano. O Império Romano desapareceu enquanto organização política e administrativa, mas sua cultura continua viva, sendo cultivada, por exemplo, aqui no Brasil! Daí a importância em conhecer a Europa Latina.

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        Tópico 2

        Os romanos invadiram a Península Ibérica entre 197 antes de Cristo e 400 depois de Cristo. Quem diria, dois mil anos mais tarde, nós aqui no Brasil estamos falando uma língua latina! Quando os romanos conquistaram a Península Ibérica eles atiraram (lanças e flechas) no que viam (os coitados dos ibéricos) e acertaram no que não viam (os povos da América Latina).

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        Mas enfim, o que levou os romanos a invadirem a Península Ibérica foi uma razão tão simples quanto antiga: a ambição humana.

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        O sul da Península foi rapidamente submetido, mas o norte e o centro permaneceram por muito tempo na mão dos antigos donos do negócio. O norte foi particularmente resistente, graças à chefia de Viriato, chefe dos Lusitanos. Em 139 a.C. eles foram atraiçoados e eliminados pelos romanos. Um ano antes tinha sido fundada a cidade de Felicitas Julia Olisipo, atual Lisboa.

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        A Hispânia Citerior foi colonizada por militares, tendo-se ali desenvolvido uma cultura mais rural, menos desenvolvida economicamente, mais ligada a Roma, de onde era accessível por terra. Em consequência, o Castelhano ou Espanhol, ali desenvolvido, seria mais inovador, transformando mais fortemente o Latim Vulgar. O Catalão se constitui num caso à parte, com sua natureza de “língua-ponte”, assumindo propriedades linguísticas da Ibero-România e da Galo-România: Baldinger (1962).

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        Tópico 3

        Agora que ficou clara a importância do Latim Vulgar, seria o caso de ler algum texto escrito nessa língua.

        Pois é, meu caro, desta vez não vai dar! O Latim Vulgar era só falado, e falado por quem não dominava a escrita – sendo que naqueles tempos, ainda por cima, poucos indivíduos dominavam a escrita. Para piorar as coisas, os japoneses ainda não tinham inventado o gravador eletrônico portátil. O jeito então é comparar as línguas românicas entre si, pois sendo descendentes do Latim Vulgar, guardaram traços dele. É como diziam os antigos: “quem sai aos seus não degenera”. [...]

        Para ajudar na reconstituição do Latim Vulgar, também se pode buscar por aí um ou outro texto latino que tenha documentado essa variedade, como as comédias romanas, as inscrições em arcos-do-triunfo e em pedras tumulares, os grafitti em paredes que tenham sobrevivido (como em Pompéia, por exemplo), e por aí vai. Mas é preciso tomar cuidado com esses testemunhos, pois é evidente que quem os escreveu sabia Latim Culto, e pode ter misturado sem querer as duas variedades.

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        Tópico 4

        A latinização da Península Ibérica pelos romanos e a existência de povos e culturas pré e pós-romanos no território criaram as condições para o surgimento do Português. Vamos ver isso passo a passo. A expansão romana pela Europa teria como resultado o surgimento de um grande conjunto de línguas, denominadas línguas românicas, derivadas do Latim Vulgar. Entre os últimos tempos do Latim e o surgimento das línguas românicas, aproximadamente entre os anos 600 e 1000, falou-se na Europa o Romance. [...]

        Subtópico 4.1

        Os cidadãos romanos tinham consciência das variedades de Latim que estavam usando, tal como hoje, quando distinguimos o Português Culto do Português Popular. Naquele tempo, as variedades do Latim eram reconhecidas e designadas pelas expressões latine loqui, isto é, falar Latim Culto, e romanice loqui, isto é, falar o Latim Vulgar dialetado que se espalharia pela Europa.

        O advérbio romanice, que aparece na expressão romanice loqui, mudaria foneticamente para Romance, passando a designar primeiramente a resultante europeia da dialetação do Latim Vulgar por toda a Europa Latina, e posteriormente um gênero literário – precisamente as narrativas redigidas nessa língua, intermediária entre o Latim Vulgar e as futuras línguas românicas. É no primeiro desses sentidos que se toma aqui a palavra Romance.

        O período Romance não é conhecido em detalhes. Tudo o que se sabe é que o Romance variava geograficamente, e já não podia mais ser considerado como Latim, dadas as profundas alterações operadas na gramática da língua de Roma, nem era ainda algumas das línguas românicas que hoje conhecemos. A própria duração do Romance variou no tempo: na França, ele parece ter sido extinto em 800, quando surge o primeiro documento em Francês, os Juramentos de Estrasburgo, de 838. Na Ibéria o “prazo de validade” do Romance foi mais extenso, e ele deve ter sobrevivido até 1100. Você sabe, os bons ares do lugar, o azeite, o queijo e o vinho...

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        Subtópico 4.3

        A Ibéria não era nenhum deserto humano quando os Romanos chegaram. Eles encontraram aqui os Bascos ou Iberos, aquele povo não Indoeuropeu, e ainda os Celtas, os Ambroilírios, os Fenícios ou Cartagineses (a quem derrotaram) e os Gregos.

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        Nenhum desses povos conseguiu preservar sua língua diante do avanço romano, com exceção dos Bascos. O Latim Vulgar receberia deles contribuições lexicais, tendo preservado sua morfologia e sua sintaxe. É por isso que o Galego, o Português e o Castelhano mantêm até hoje uma gramática neolatina.

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        Subtópico 4.4

        A Península Ibérica não virou um paraíso na terra só porque os romanos tinham chegado e tomado conta do pedaço.

        Estavam os descendentes dos romanos muito felizes com suas novas propriedades hispânicas, quando o lugar entrou na mira dos germanos. Logo os germanos, que tanta confusão já tinham armado no coração mesmo do Império, e que acabariam por dar-lhe fim, em 497 d.C.! Mas não apenas os germanos fizeram estripulias no lugar! Mal começada a Era Moderna, lá vieram os Árabes acabar com a graça dos descendentes dos invasores germânicos.

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        Tópico 6

        O Português Arcaico foi falado e escrito entre os sécs. XIII e XVI, mais precisamente, até o ano de 1540.

        Se há um assunto complicado é o da datação das línguas e das fases históricas pelas quais elas passaram. Pense um pouco. A história dos povos exige datas, afinal ela é uma narrativa de eventos que se dispõem na linha do tempo. Até aí tudo bem. O problema é que na história das línguas só podemos datá-las através de documentos nos quais elas apareçam escritas. Ora, quando uma dada língua chega a ser escrita, é por que já vinha sendo falada há muito tempo! Há quanto tempo? Impossível saber. De modo que vamos olhar estas datas todas com um pé atrás, entendendo que elas são aproximativas.

        Neste quadro de dificuldades, diversos autores têm trabalhado com a hipótese de que o Português surgiu quando se deixou de escrever documentos no Romance do Noroeste da Península, adotando-se a língua que decerto já vinha sendo falada há tempos. Ora, isso se deu por volta de 1200, talvez um pouco antes, isto é, entre o séc. XII e o séc. XIII. Logo, podemos dizer – até que se descubram documentos mais antigos – que o Português se formou nessa data, e que portanto já existe há 800 anos. Velhinho, hein? Pois não é não. O Francês é pouco mais de três séculos mais velho, e o Castelhano existe desde 900 e tal. Imagine então a idade das línguas da Índia, da China e do Japão!

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        Tópico 7

        Levou tempo para que se tomasse consciência do Português como uma nova língua. Tiveram importância nesse ofício duas instituições, que agiram como centros irradiadores de cultura na Idade Média: os mosteiros, onde se levavam a cabo traduções de obras latinas, francesas e espanholas (Mosteiros de Santa Cruz e Alcobaça) e a Corte, para a qual convergiam os interesses nacionais. Escreviam ali fidalgos e trovadores, aprimorando a língua literária.

        Constituída essa consciência linguística, passamos ao século XVI, quando o debate hoje rotulado como “a questão da língua”, além da publicação das primeiras gramáticas e dicionários, focalizaram a importância do Português, sua expansão e sua oposição ao castelhano.

        Gramáticos portugueses dos séculos XVI e XVII proclamam as virtudes da língua pátria, capaz de veicular quaisquer tipos de sentimentos e arrazoados. Eles se opunham àqueles que julgavam as línguas românicas veículos toscos, insuficientes para as altas criações do espírito. E aqui entra Camões, com seus célebres versos.

        E na língua, na qual quando imagina

        Com pouca corrupção crê que é a Latina (Lus. I, 33)

        A ninguém passou despercebida a relação entre a expansão do Império e a Língua Portuguesa, que seria levada aos quatro cantos do mundo. Escritos evidenciam essa percepção, como se pode ler nos primeiros gramáticos, um dos quais, João de Barros, escreveu as Décadas da Ásia, em que trata igualmente do assunto.

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        Finalmente, o Romantismo vem encontrar os gramáticos atentos ao gênio da língua e ao papel do povo em sua elaboração. Já agora a questão da língua é entregue à ciência, personificada em Francisco Adolfo Coelho, fundador da Linguística Portuguesa. A história da língua passa a incorporar a língua não escrita. E nisto estamos.

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Ataliba T. de Carvalho. Como, onde e quando nasceu a língua portuguesa? Disponível em: http://www.museudalinguaportuguesa.org.br/files/mlp/texto_9.pdf. Acesso em: 3 fev. 2015. p. 01-36.

Fonte: Universos – Língua Portuguesa – Ensino fundamental – Anos finais – 8º ano – Camila Sequetto Pereira; Fernanda Pinheiro Barros; Luciana Mariz. Edições SM. São Paulo. 3ª edição, 2015. p. 25-28.

Entendendo a divulgação:

01 – O que é a Europa Latina e qual sua importância para a língua portuguesa?

      A Europa Latina é a parte europeia que restou do Império Romano. É importante porque, embora o Império Romano tenha desaparecido como organização política, sua cultura continuou viva, e foi dela que se originaram as línguas latinas, incluindo o português.

02 – Quando e como os romanos invadiram a Península Ibérica?

      Os romanos invadiram a Península Ibérica entre 197 a.C. e 400 d.C. O motivo principal dessa invasão foi a ambição humana, e eles gradualmente submeteram a região, enfrentando resistência no norte, como a liderada por Viriato.

03 – Qual era a diferença entre Latim Culto e Latim Vulgar?

      O Latim Culto era a variedade formal da língua, dominada pela escrita e usada por aqueles com educação. O Latim Vulgar, por sua vez, era a língua falada cotidianamente pelas pessoas que, em sua maioria, não dominavam a escrita, e foi essa variedade que se espalhou e deu origem às línguas românicas.

04 – Por que é difícil estudar o Latim Vulgar diretamente através de textos?

      É difícil estudar o Latim Vulgar diretamente porque ele era uma língua essencialmente falada e utilizada por pessoas que não dominavam a escrita. Os textos latinos que sobreviveram são geralmente em Latim Culto, e mesmo quando há vestígios do Latim Vulgar (como em comédias romanas ou grafites), é preciso cautela, pois os autores podiam misturar as variedades.

05 – O que foi o período "Romance" na formação das línguas românicas?

      O período Romance foi uma fase intermediária, aproximadamente entre os anos 600 e 1000 d.C., entre o Latim Vulgar e o surgimento das línguas românicas. Nesse período, o Latim Vulgar já havia sofrido profundas alterações gramaticais e geográficas, mas ainda não era nenhuma das línguas românicas que conhecemos hoje.

06 – Quando se estima que o português "nasceu" como uma língua distinta?

      Estima-se que o português se formou por volta de 1200 d.C., ou seja, entre os séculos XII e XIII. Essa data é aproximada, marcada pelo momento em que documentos deixaram de ser escritos no Romance do Noroeste da Península e a língua que já era falada passou a ser registrada.

07 – Quais povos habitavam a Península Ibérica antes da chegada dos romanos, e qual deles conseguiu preservar sua língua?

      Antes dos romanos, a Península Ibérica era habitada por povos como os Bascos (ou Iberos), Celtas, Ambroilírios, Fenícios (ou Cartagineses) e Gregos. Desses, apenas os Bascos conseguiram preservar sua língua diante do avanço romano.

08 – Como a invasão dos povos germânicos e árabes influenciou a Península Ibérica após a romanização?

      Após a romanização, a Península Ibérica foi invadida pelos germanos, que desestabilizaram o Império Romano. Mais tarde, com o início da Era Moderna, os árabes também invadiram a região, alterando ainda mais o cenário cultural e linguístico.

09 – Quais instituições foram importantes para a tomada de consciência do português como uma nova língua na Idade Média?

      Duas instituições foram cruciais: os mosteiros (como os de Santa Cruz e Alcobaça), que realizavam traduções e disseminavam cultura, e a Corte, para onde convergiam os interesses nacionais e onde fidalgos e trovadores aprimoravam a língua literária.

10 – Qual o papel de autores como Camões e João de Barros na valorização da língua portuguesa?

      Autores como Camões e João de Barros desempenharam um papel fundamental na valorização do português. No século XVI, eles e outros gramáticos proclamaram as virtudes da língua pátria, defendendo sua capacidade de expressar sentimentos e ideias complexas, opondo-se àqueles que a consideravam inferior. João de Barros, em suas Décadas da Ásia, também evidenciava a relação entre a expansão do Império Português e a disseminação da língua.

 

 

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