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sábado, 10 de maio de 2025

POEMA: IDEIAS ÍNTIMAS - FRAGMENTO - ÁLVARES DE AZEVEDO - COM GABARITO

 Poema: Ideias íntimas – Fragmento

             Álvares de Azevedo

I

Ossian o bardo é triste como a sombra

Que seus cantos povoa. O Lamartine

É monótono e belo como a noite,

Como a lua no mar e o som das ondas...


Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgq0Jkehpwnc9hCEi1tUtsQwyYzsJoMb_Z3pN9qMAcSv8Lr9qr3z3GU2uh_mNIfZZ5uqf4_9680KbOmbhPrDAXdcjKOKeke1q4-kZxuMPTYaWWdfEul5b90SMUEgRNSczl1bNWopKWpQj1jgF-iS9w-ErzcrwVSgRX6VGyNTRGilkYomMJvN8sVBiRIGaI/s1600/images.jpg

[...]

Parece-me que vou perdendo o gosto,

Vou ficando blasé: passeio os dias

Pelo meu corredor, sem companheiro,

Sem ler, nem poetar. Vivo fumando.

Minha casa não tem menores névoas

Que as deste céu d’inverno... Solitário

Passo as noites aqui e os dias longos.

Dei-me agora ao charuto em corpo e alma:

[...]

X

Meu pobre leito! eu amo-te contudo!

Aqui levei sonhando noites belas;

As longas horas olvidei libando

Ardentes gotas de licor dourado,

Esqueci-as no fumo, na leitura

Das páginas lascivas do romance...

 

Meu leito juvenil, da minha vida

És a página d’oiro. Em teu asilo

Eu sonho-me poeta e sou ditoso,

E a mente errante devaneia em mundos

Que esmalta a fantasia! Oh! quantas vezes

 

Do levante no sol entre odaliscas

Momentos não passei que valem vidas!

Quanta música ouvi que me encantava!

Quantas virgens amei! que Margaridas,

Que Elviras saudosas e Clarissas,

Mais trêmulo que Faust, eu não beijava,

Mais feliz que Don Juan e Lovelace

Não apertei ao peito desmaiando!

Ó meus sonhos de amor e mocidade,

Porque ser tão formosos, se devíeis

Me abandonar tão cedo... e eu acordava

Arquejando a beijar meu travesseiro?

XII

Aqui sobre esta mesa junto ao leito

Em caixa negra dois retratos guardo.

Não os profanem indiscretas vistas.

Eu beijo-os cada noite: neste exílio

Venero-os juntos e os prefiro unidos

— Meu pai e minha mãe! Se acaso um dia

Na minha solidão me acharem morto,

Não os abra ninguém. Sobre meu peito

Lancem-os em meu túmulo. Mais doce

Será certo o dormir da noite negra

Tendo no peito essas imagens puras.

XIV

Parece que chorei... Sinto na face

Uma perdida lágrima rolando...

Satã leve a tristeza! Olá, meu pagem,

Derrama no meu copo as gotas últimas

Dessa garrafa negra...

Eia! bebamos!

És o sangue do gênio, o puro néctar

Que as almas do poeta diviniza,

O condão que abre o mundo das magias!

Vem. Fogoso Cognac! É só contigo

Que sinto-me viver. Inda palpito,

Quando os eflúvios dessas gotas áureas

Filtram no sangue meu correndo a vida,

Vibram-me os nervos e as artérias queimam,

Os meus olhos ardentes se escurecem

E no cérebro passam delirosos

Assomos de poesia... Dentre a sombra

Vejo num leito d’ouro a imagem dela

Palpitante, que dorme e que suspira,

Que seus braços me estende...

Eu me esquecia:

Faz-se noite; traz fogo e dois charutos

E na mesa do estudo acende a lâmpada...

In: Álvares de Azevedo, cit., p. 31-38.

Fonte: Livro – Português: Linguagens, 2ª Série – Ensino Médio – William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães, 9ª ed. – São Paulo: Saraiva Editora, 2013. p. 88.

Entendendo o poema:

01 – Qual a principal atmosfera emocional que se depreende dos versos iniciais do poema, comparando Ossian e Lamartine?

      A principal atmosfera emocional é de melancolia e introspecção. Ossian é comparado à sombra triste que povoa seus cantos, enquanto Lamartine evoca uma beleza melancólica, como a noite, a lua no mar e o som das ondas, sugerindo um estado de espírito contemplativo e talvez um tanto sombrio do eu lírico.

02 – Descreva o estado de espírito do eu lírico na segunda estrofe (versos 6-15). Quais são seus hábitos e a que ele compara sua casa?

      O eu lírico demonstra um sentimento de tédio e apatia ("vou ficando blasé", "sem companheiro, sem ler, nem poetar"). Seu hábito principal é fumar. Ele compara sua casa a um céu de inverno, sugerindo um ambiente frio, sombrio e solitário, tanto física quanto emocionalmente.

03 – No fragmento da décima estrofe, qual a relação do eu lírico com seu "pobre leito"? Que tipo de memórias e experiências ele associa a esse lugar?

      Apesar de chamá-lo de "pobre leito", o eu lírico o ama e o considera a "página d’oiro" de sua vida juvenil. Ele associa a ele memórias de sonhos belos, noites de esquecimento através da bebida e da leitura de romances lascivos. É um espaço de fantasia onde ele se sente poeta e feliz, imaginando encontros amorosos idealizados com diversas figuras femininas.

04 – O que representam os dois retratos guardados em uma caixa negra junto ao leito? Qual o pedido do eu lírico em relação a eles caso o encontrem morto?

      Os dois retratos representam o pai e a mãe do eu lírico. Ele os venera e os prefere unidos, beijando-os todas as noites em seu exílio (provavelmente um exílio emocional ou de solidão). Seu pedido é que, caso o encontrem morto, ninguém abra a caixa, mas que os retratos sejam lançados sobre seu peito no túmulo, pois acredita que isso tornará seu sono na noite da morte mais doce.

05 – Na décima quarta estrofe, qual a mudança de humor expressa pelo eu lírico? A que ele atribui o poder de divinizar a alma do poeta e abrir o mundo das magias?

      Há uma mudança de humor da melancolia ("Parece que chorei...") para uma tentativa de euforia e escape. Ele atribui ao "fogoso Cognac" o poder de divinizar a alma do poeta e abrir o mundo das magias, vendo-o como o "sangue do gênio" e o "puro néctar".

06 – Que visão ou delírio o eu lírico experimenta sob o efeito da bebida? Qual a sua reação imediata após essa visão?

      Sob o efeito da bebida, o eu lírico tem a visão delirante de uma mulher em um leito de ouro, palpitante, dormindo e suspirando, estendendo-lhe os braços. Sua reação imediata é de esquecimento do contexto presente ("Eu me esquecia:") e um pedido para que tragam fogo e dois charutos e acendam a lâmpada na mesa de estudo, indicando um retorno à realidade e a seus hábitos.

07 – Identifique elementos característicos da segunda geração do Romantismo (Ultra-Romantismo ou Byronismo) presentes neste fragmento do poema.

      Vários elementos característicos do Ultra-Romantismo estão presentes:

      Melancolia e Pessimismo: O tom geral do poema é de tristeza, tédio e solidão.

      Idealização da Morte: O desejo de ser enterrado com os retratos dos pais sugere uma idealização da morte como um refúgio.

      Fuga da Realidade: A busca por escapismo através da bebida, do fumo e das fantasias amorosas no leito.

      Subjetivismo e Egocentrismo: O foco intenso nos sentimentos e experiências do eu lírico.

      Exaltação do Eu e do Gênio: A crença no poder "divinizador" da bebida para o poeta.

      Amor Idealizado e Sofrido: As memórias dos amores juvenis idealizados, contrastando com a solidão presente.

      Linguagem Exacerbada e Sensual: O uso de expressões como "páginas lascivas", "ardentes gotas de licor dourado" e a descrição da visão da mulher.

      Referências a Figuras Românticas: A menção a Ossian e Lamartine, poetas importantes do Romantismo.

 

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