Crônica: Guerreiros dos Malotes
Walcyr Carrasco
Quatro horas da tarde. Estou subindo a avenida Rebouças e observo a montanha de carros à minha frente. Trânsito lento. Lentíssimo. Ouço música. De repente, sinto uma pancada no carro. Um motoboy acaba de arrasar com meu espelho. Nem se digna olhar para trás. Continua ondulando por entre os carros paralisados. Dá vontade de descer e persegui-lo. Não seria nem para reclamar o espelho de volta. Mas para exigir respeito. No mínimo, um pedido de desculpas. Tarde demais. Ele está longe. Eu, sem retrovisor.
Já sei. Vão acabar dizendo que tenho obsessão
pelos problemas de trânsito.
Que durmo pensando em semáforos, assim como
tenho pesadelos com minha barriga. Pode ser. Ando louco com os motoboys. Nada
mais prático do que usar moto numa cidade como a nossa. Motoboys são uma
categoria à parte. Encolhem se para passar entre os carros, atravessam as ruas
em diagonal. Pintura raspada é detalhe sem importância. Outro dia uma amiga
conversava comigo de janela aberta, o braço para fora. Ouviu um barulhinho,
instintivamente puxou o braço. Por um triz não perdeu o cotovelo.
— Ei! Toma cuidado! — gritou.
Como sempre, o rapaz nem diminuiu a velocidade
para conferir.
Quando o trânsito flui, também não é fácil. As
motos parecem surgir do nada. Cortam pela direita, atravessam na frente,
empinam para a esquerda. Sair no Itaim-Bibí domingo à noite é arriscadíssimo. O
motivo: a maré de motoboys entregando pizzas. Paulistano que se preza adora uma
pizza aos domingos. O Itaim-Bibi possui uma das maiores concentrações de
devoradores de pizza do planeta. Pelo menos é o que me contou um morador do
bairro. É uma correria total, para que as pizzas cheguem quentinhas. Enquanto
isso, os transeuntes correm para não ser atropelados pelas calabresas,
margheritas e mussarelas. Às vezes ocorrem tragédias. A família senta-se à
mesa, os estômagos ronronam. Abre se a caixa. O presunto da meia portuguesa
rolou sobre a meia mussarela. Â família passa parte do jantar arrumando o
presunto e capturando as azeitoninhas pretas que se espalharam pela tampa toda.
Motoboys têm seus truques. Um deles me explicou:
— E mole cortar ônibus. Presto atenção ao
motor. Se está baixinho, é que ainda está pegando passageiro, e eu entro em
cima. Se o barulho aumenta, danou-se!
Bela filosofia de vida, não?
Um amigo teve o capo atingido por um
apressadinho. Desceu do carro pronto para pegar o número da chapa, fazer
ocorrência. Todos os motoboys que passavam por perto perderam a pressa. Pararam
em torno, ameaçadores. Unidos.
— Que foi aí?
O motorista passou de vítima a agressor. Em
cinco segundos a história era outra. Começaram a ameaçar. Meu amigo refugiou-se
no carro, antes que apanhasse.
E uma profissão sofrida. Não se ganha muito,
trabalha-se no sol e na chuva. Existe uma complacência a respeito do assunto,
devido à questão social. O que se lucra com isso? Entre eles, defendem-se como
se pertencessem a uma tribo guerreira. Dirigir moto parece despertar esse tipo
de reação. O sujeito se sente cavalgando um corcel árabe pelas dunas do
deserto. Mesmo que esteja apenas entregando um malote de burocráticas cartas
comerciais. Por baixo do capacete vive um tuaregue. Um beduíno prestes a
enfrentar a guarda do sultão e resgatar uma odalisca do harém. Mas e eu, como
fico? Só quero sair de um lugar e chegar inteiro a outro. Meu sonho é dirigir
sem ter um infarto em cada cruzamento. A salvo dos guerreiros dos malotes.
01. Qual é o incidente que acontece com o carro do autor enquanto ele está no trânsito?
a) Um pneu furado.
b) Uma colisão
traseira.
c) Um arranhão na
pintura.
d) O
retrovisor é danificado por um motoboy.
02. Qual é a reação do motoboy após
danificar o retrovisor do carro do autor?
a) Ele pára para pedir desculpas.
b) Ele continua seu caminho sem se
importar.
c) Ele volta para consertar o
estrago.
d) Ele chama a polícia para resolver
a situação.
03. Por que o autor menciona ter pesadelos
com sua barriga no início da crônica?
a) Ele se preocupa com sua saúde.
b) Ele faz uma analogia entre suas
preocupações e o trânsito.
c) Ele tem medo de dirigir.
d) Ele teme a má alimentação.
04. O que o autor observa sobre os motoboys
em relação ao trânsito?
a) Eles obedecem rigorosamente às
regras de trânsito.
b) Eles são rápidos e eficientes para
se locomover na cidade.
c) Eles frequentemente causam acidentes e
ignoram os outros motoristas.
d) Eles preferem usar carros em vez
de motos.
05. O que acontece quando o trânsito flui,
de acordo com o autor?
a) As motos desaparecem.
b) As motos parecem surgir repentinamente.
c) Os carros se movem lentamente.
d) As ruas ficam vazias.
06. Qual é a situação específica que torna
arriscado sair no Itaim-Bibí domingo à noite?
a) A presença de pedestres
distraídos.
b) A alta concentração de motoboys
entregando pizzas.
c) O trânsito intenso de carros.
d) O fechamento das ruas para
eventos.
07. Como os motoboys identificam se podem
cortar um ônibus, de acordo com um deles?
a) Pela cor do ônibus.
b) Pelo motor do ônibus.
c) Pelo barulho do motor do ônibus.
d) Pela velocidade do ônibus.
08. O que acontece quando um amigo do autor
tenta resolver um acidente envolvendo um motoboy?
a) O motoboy pede desculpas
imediatamente.
b) Os motoboys que passam ameaçam o
amigo.
c) A polícia intervém rapidamente.
d) O autor convence os motoboys a
resolverem pacificamente.
09. Como o autor descreve a profissão de
motoboy?
a) Lucrativa e confortável.
b) Difícil e pouco remunerada.
c) Despreocupada e relaxante.
d) Segura e estável.
10. Qual é o sentimento do autor em relação
aos motoboys ao final da crônica?
a) Admiração pelo seu trabalho árduo.
b) Incompreensão pela sua maneira de
conduzir.
c) Solidariedade por suas
dificuldades.
d) Frustração
e desejo de evitar conflitos.
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