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terça-feira, 30 de abril de 2024

CRÔNICA: O CARDÁPIO DO MEDO - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: O Cardápio do Medo

                 Walcyr Carrasco

 Hora do almoço. À minha frente, um prato de frango grelhado com berinjela à milanesa. Minha barriga canta de felicidade. Penso melhor. Deveria sair correndo. Segundo soube, nada pior do que a pele do frango. E um depósito de colesterol. E também a parte mais gostosa. Puxa! O colesterol deve produzir um sabor delicioso. Tudo que é bom tem colesterol às pampas, como torresmo e gema de ovo frito. Suspiro. Ainda não inventaram o colesterol diet.  Retiro a pelezinha. E o frango em si? 

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhqq6wbSYScdtpAAj3Y1tMHWPlqYQ-zmxO8xdXMrt06C4aFyrccL0gRqX6RDZSR9xwV3pt0qKLSqHWk4nvxQo6BUv_U6_dl6mTwW5sGrPKajgQDR7I7V-qFZkSjq56744K0k_MF7IwBYlNOkt2vAkVJ7uyoRrZrT4_E_nB1o9aK5AJukA4Y3Ht1TIUyKrA/s1600/BERINJELA.jpg


Uma reportagem na televisão revelou que os frangos podem estar contaminados com hormônios capazes de produzir doenças pavorosas. A berinjela à milanesa também não é inocente. A fritura vai poluir minhas artérias. Pego uma goiaba com casca. Quem garante ter sido devidamente esterilizada? Entre outros mimos, pode dar cólera.

Tornou-se complicado comer. Meu acupunturista sugeriu:

— O bom é ter sempre peixe na mesa.

Eu gosto de peixe. De frutos do mar também, mas o camarão (justamente o camarão!) é um poço de colesterol. Os peixes seriam totalmente inocentes.

Seriam. Uma amiga médica avisou:

— Com a poluição, os peixes têm excesso de mercúrio.

Perigosíssimo!

Sempre achei queijo saudável. Ledo engano. São os novos vilões, devido ao índice de gordura. Pior, mesmo, só hambúrguer com bacon e maionese. E como sobreviver sem maionese, creme de leite, queijo parmesão? Aconselho-me novamente com o acupunturista.

— Evite o leite comum. Tome bastante leite de soja e coma tofu.

Bem, uma vida à base de tofu não é exatamente uma versão do paraíso.

Abro uma revista. Um médico explica como tirar o leite da dieta é perigoso.         

— Soja não é leite — adverte.

Estarei arriscado a várias doenças decorrentes da falta de cálcio, se evitar o

leite. Entre elas, osteoporose, artrite. Ah, se pelo menos eles concordassem entre si! Adoro sal. Sou aconselhado a evitar. Pode causar hipertensão.

—- Minha pressão sempre foi ótima! — tento me defender. O amigo com quem converso abana a cabeça, cauteloso.

— E melhor prevenir.

Termina explicando:

— A melhor dieta é a vegetariana.

Quando me vê com o nariz mergulhado em um prato de folhas de alface, outro amigo adverte:

—As verduras estão contaminadas por agrotóxicos.

— E o que devo comer, grama?

Existem fazendas especializadas em produzir frutas e legumes sem agrotóxicos. Vou à feira do Parque da Água Branca, conhecidíssima entre quem gosta de comida natural. Vejo umas cenouras mirradinhas. São elas. Começo a me conformar com uma existência à base de sopa de verduras e queijo de soja. Mas...

— O ideal é tomar um cálice de vinho por dia — aconselha o cardiologista.

— Não é melhor virar a garrafa inteira de uma vez? — interesso-me.

Ele ergue as sobrancelhas:

— Um cálice, como se fosse remédio.

Tomar vinho como remédio? Já perdeu a graça! Açúcar, nem pensar. Dizem ser a raiz de todos os males. Tudo, absolutamente tudo, tem uma porcentagem de glicose. Dá vontade de chorar. O sorvete mais inocente é um risco! Um pedaço de mil-folhas, uma tentativa de suicídio!

Rebelo-me. Tornou-se impossível comer qualquer coisa sem uma advertência médica. Tentei me refestelar na comida light. Avisaram-me de que nem sempre é tão light assim! Resolvo ser feliz. Encho o carrinho com caixas e caixas de bombons.

Em casa, abro o primeiro. Uma linda trufa de chocolate. Ao mesmo tempo leio uma reportagem. Descobriram que o chocolate reduz o colesterol! Vitória! Encho a boca de bombons! Finalmente posso me fartar em paz! Até, é claro, uma nova descoberta aterrorizante!        

Entendendo o texto

01. Qual é a preocupação principal do autor ao escolher seu almoço?

a. A origem dos alimentos.

b. O sabor dos pratos.

c. O valor nutricional dos alimentos.

d. O medo de contaminação e doenças.

     02. O que o acupunturista sugere como alternativa saudável para a dieta?

         a. Frango grelhado.

         b. Peixe.

         c. Carne vermelha.

         d. Camarão.

   03. Por que o autor tem receios em relação ao consumo de peixes?

          a. Por causa do colesterol presente nos peixes.

          b. Por causa da poluição que causa o excesso de mercúrio nos peixes.

          c. Porque são alimentos muito calóricos.

          d.  Porque o autor não gosta do sabor dos peixes.

     04. O que o autor menciona como um alimento outrora considerado saudável, mas que agora é visto como prejudicial?

           a. Frutas.

           b. Legumes.

           c. Queijo.

           d. Leite.

   05. Por que o autor desconfia das dietas vegetarianas?

          a.  Porque acredita que não fornecem nutrientes suficientes.

          b. Porque as verduras podem estar contaminadas por agrotóxicos.

           c. Porque a carne é considerada mais saudável.

           d. Porque não gosta do sabor dos vegetais.

   06. Qual é o conselho do cardiologista sobre o consumo de vinho?

           a. Consumir um cálice por dia como remédio.

          b. Evitar o consumo de vinho.

          c. Consumir a garrafa inteira de uma vez.

          d. Trocar o vinho por suco de frutas.

    07. O que o autor descobre sobre o consumo de chocolate enquanto saboreia bombons?

           a. O chocolate pode causar doenças cardíacas.

           b. O chocolate reduz o colesterol.

           c. O chocolate tem alto teor de gordura.

           d. O chocolate não é recomendado para dietas.

    08. Qual é a reação do autor diante das descobertas sobre os alimentos?

           a. Ele decide seguir uma dieta rigorosa.

           b. Ele se revolta e decide ser feliz comendo o que gosta.

           c. Ele se torna vegetariano.

           d. Ele decide consultar mais médicos.

    09. Por que o autor menciona o consumo de açúcar como algo a evitar?

           a. Porque o açúcar pode causar diabetes.

           b. Porque o açúcar é prejudicial ao sistema cardiovascular.

           c. Porque o açúcar é fonte de colesterol.

           d. Porque o açúcar é a raiz de todos os males.

   10. Qual é a conclusão final do autor sobre suas escolhas alimentares?

          a. Ele decide se tornar vegetariano.

          b. Ele continua preocupado com os riscos alimentares.

          c. Ele decide aproveitar os prazeres da comida sem se preocupar.

           d. Ele opta por uma dieta baseada em tofu.

 

 

CRÔNICA: A VIDA É FALSA - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: A Vida é Falsa

                Walcyr Carrasco

 Estou em uma churrascaria. Termino de devorar pedaços variados de alcatra, de picanha, de costela. Sinto um pedacinho de carne infiltrado entre meus dentes. Tento arrancar com a língua, de leve. Inútil. Aspiro. Um ruído sai da minha boca. Shieeeeee! Os companheiros de mesa levantam os olhos. Estendo a mão para pegar o paliteiro. Sim, em churrascarias ainda existem paliteiros.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgtBnkpQf9cKZ_m8F-PZ0-U1cetV5CUHrRDP6vPHCmqG7q5VHVKYUSpk9QniEgr6t7wJle1QVCFdCLVtc3pBLtSY7BYNVjRT3vSwhvkiwHA2U5911o9oz7eZ9o8_JRQBtEJOKaytXmuwyrepekl74bhS7SW7L0oOxJwsrDFSsWbtB_Dp1uP94_48m2jMMc/s320/PALITEIRO.jpg


 Nos restaurantes mais finos, eles vêm encapsulados. Ou nem mesmo são colocados na mesa. Agarro um palito. A moça na minha frente me olha horrorizada. Lembro-me de todos os manuais de etiqueta. E proibido palitar os dentes em público. No máximo pode-se palitar trancado no toalete, como se fosse um segredo inconfessável. Abandono o palito na mesa. Em seguida, penso: "Por que é proibido palitar os dentes?".

Não há motivo lógico para tornar o ato tão vergonhoso. Enfio o palito nos dentes, sob o olhar constrangido da mesa. Sorrio, deliciado. Existe coisa melhor do que palitar os dentes após uma refeição?

Dizem que é feio fazer isso, fazer aquilo. Já não sei. Outro dia estava andando no condomínio. Um cachorrinho saiu de uma casa, correu, mordeu e rasgou minha calça. A moça — por sinal veterinária, como soube depois —, em vez de perguntar se eu estava machucado, gritou, furiosa.

— Desculpa.

— Rasgou minha calça! -— respondi.

— O que você quer que eu faça, já pedi desculpas?! — revidou a dama.

Exigi uma calça nova. Não só por ser do meu direito. Mas pela atitude dela, que nem se preocupou em saber se eu estava ferido. Dias depois, insisti em receber a calça. Um amigo torceu o nariz.

— Mas pode parecer mesquinharia.

— E daí se estou sendo mesquinho? — respondi. — Então é feio exigir

o que é justo?

Acontece sempre. Basta a gente pedir alguma coisa que é do nosso direito; e que envolve uma pequena quantia, para receber cara feia. Quantas vezes, em restaurantes, são esquecidas as moedas, ou as notas mais baixas? Sem. nenhuma explicação. Outro dia, no shopping D&D, paguei o estacionamento. De troco, um real. O rapaz nem se mexeu. Foi preciso dizer: — Pode me dar o troco, faz favor?

Atirou a nota nos meus dedos, como se eu fosse um monstro. Há uma infinidade de coisas banidas da vida social. Comer frango com a mão, por exemplo. E delicioso agarrar uma coxa com as mãos! As regras de etiqueta até permitem, mas ninguém tem coragem. Ficam cortando pedacinhos com a faca, enquanto o osso rola no prato. E chupar q tutano? Quem nunca provou não sabe o que está perdendo. E uma delícia. Já me avisaram:

— Você vai ficar com a boca lambuzada.

— Lambuzou, lavou! — respondo.

Na trilha do frango, vai a manga. Cravar os dentes no caroço de uma manga bem madura é inesquecível. Todo mundo serve a fruta cortadinha. Existem frutas que nem são servidas diante de convidados. Jaca, por exemplo. Impossível comer jaca de garfo e faca. Resultado: ninguém mais oferece. Tem gente que acha feio até comer sanduíche com a mão. Já recebi muitos olhares de acusação ao agarrar um cheesebúrguer e meter os dentes, enquanto a pessoa na minha frente corta os pedacinhos. São tantas as falsidades que já nem sei como me comportar.

Outro dia cheguei a uma festa de aniversário e perguntei, alegre.  Quantos anos?

 A aniversariante virou a cara. Na hora do bolo, só uma vela solitária.

Acabei comentando:

— Se ela botasse todas as velinhas, provocaria um incêndio!

Quase fui expulso.

Alguém me responda: como dar festa de aniversário sem que perguntem a idade?

Já me conformei. Se é para deixar de ser espontâneo, prefiro ser chamado de mal-educado. Pelo menos a vida se torna mais confortável.

Entendendo o texto

01. O que o autor sente após uma refeição em uma churrascaria que o leva a pegar um palito de dente?

      a. Um desconforto estomacal.

      b. Um pedaço de carne entre os dentes.

      c. Um desejo de palitar os dentes em público.

      d. Um sorriso de satisfação.

02. Por que o autor considera estranho palitar os dentes em público?

       a. Porque é proibido pelas regras de etiqueta.

       b. Porque os palitos de dente são difíceis de encontrar.

       c. Porque é uma prática insegura.

       d. Porque os amigos não gostam dessa atitude.

 03. Qual foi a reação da moça veterinária após o cachorro rasgar a calça do autor?

         a. Ela pediu desculpas e ofereceu ajuda.

         b. Ela ficou preocupada com o autor.

         c. Ela gritou furiosa e não demonstrou preocupação.

         d. Ela ofereceu dinheiro para consertar a calça.

  04. Por que o autor exigiu uma calça nova após o incidente com o cachorro?

          a. Porque queria uma calça melhor.

          b. Porque achou a reação da moça injusta.

          c. Porque queria parecer mesquinho.

          d. Porque não estava machucado.

   05. O que o autor observa sobre receber o troco em uma situação no shopping?

           a. Os trocos são dados com gentileza.

           b. Os funcionários são sempre educados.

           c. Às vezes, é necessário pedir o troco.

           d. Ninguém oferece troco em lojas.

   06. Segundo o autor, por que certas práticas, como comer frango com as mãos, são evitadas em público?

           a. Porque é proibido por lei.

           b. Porque as pessoas têm medo de se sujar.

           c. Porque as regras de etiqueta desaprovam esses comportamentos.

           d. Porque é mais educado usar talheres.

     07. Qual é a atitude do autor em relação às convenções sociais mencionadas na crônica?

          a. Ele se conforma com elas.

          b. Ele desafia essas convenções.

          c. Ele as ignora completamente.

          d. Ele as respeita totalmente.

    08. Por que o autor menciona a experiência em uma festa de aniversário?

          a. Para criticar a falta de velas no bolo.

          b. Para mostrar como é difícil evitar certas perguntas.

          c. Para explicar por que foi expulso da festa.

          d. Para falar sobre a comemoração de aniversário.

     09. Como o autor se sente em relação ao comportamento espontâneo versus seguir as regras sociais?

           a. Ele prefere ser considerado mal-educado.

           b. Ele prefere seguir as regras sociais rigidamente.

           c. Ele se conforma com as normas sociais.

           d. Ele busca sempre agradar as pessoas ao seu redor.

      10. Qual é a principal crítica do autor em relação às convenções sociais mencionadas na crônica?

           a. Elas são essenciais para a boa convivência.

           b. Elas são hipócritas e falsas.

           c. Elas são úteis para evitar conflitos.

           d. Elas promovem uma vida confortável.     

 

 

 

 

CRÔNICA: VÍTIMA DAS EMBALAGENS - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Vítima das Embalagens

                 Walcyr Carrasco

 Entro no chuveiro. Relaxo na água quentinha. Pego o xampu. É novo. Tento virar a tampa. Não cede. Aproximo meus olhos míopes. Está envolta em um plástico duro, transparente. Puxo. Minhas unhas curtas resvalam. A batalha demora alguns instantes. Minhas investidas não produzem resultado algum. Tenho cabelos oleosos. Sem um bom xampu, fico tão charmoso quanto um tapete de pele de carneiro. Ataco a tampa a mordidas. Meus dentes rangem. Mal arranco uma lasquinha. O xampu cai da minha mão. Abaixo-me. Tropeço. Caio sentado. O frasco continua invicto.

Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgn2BnLNAuonn2soRgBl5AuR-fwsba7VSZdhiAJhARbtxUCpc6AyZ5mpN3KFfmBefhS_rnO4N1KxFxxhpJb7PDKT3VmnBojrSMIksSJPwLVeVfc-kfsefZXFV2CrnomUz-YzX_LabnnboY7jns404-LmVXpe4pp0BmDdIyTYKH8RAHOC7_fOGOJjz3bZrI/s1600/CHAVINHA.jpg


Recentemente, também fui vítima de uma lata de patê de fígado. Era daquele tipo que vem com uma chavinha. O segredo é enrolar a chavinha bem devagar em torno do topo, até que a parte de cima se solte. Teoricamente. Como sempre, fiquei com a chavinha inútil numa mão e a lata fechada na outra. Os amigos bebiam cerveja na sala. Quis enfiar a chavinha de novo. Impossível. Tentei com o abridor. Não havia ângulo para apoiar. Peguei uma faca e um martelo. Fui esfaqueando a lata pela parte de cima. Cavava um buraco, em seguida outro do lado, e assim por diante. Quando achei que dava, puxei. Abri.

Mas a lata, cheia de pontas metálicas, bateu na minha mão.

Espalhei patê pelo piso. Eu me cortei. Um cortezinho ridículo, mas corte. Os amigos vieram correndo. Falaram em tétano e pronto-socorro. Jurei nunca mais comprar patê de fígado com chavinha. -

Frascos, latas e semelhantes levam qualquer ser humano à beira da loucura. Remédios e vitaminas são hors-concours. Só provam uma coisa: quem conseguir abrir está perfeitamente saudável. As aspirinas têm vindo com uma tampa na qual há uma setinha minúscula em relevo. A tal setinha tem de encaixar com outra marquinha. Algo tão minucioso quanto abrir um cofre sem o segredo. Para quem está estalando de dor de cabeça, uma delícia. Alguns sucos vêm em embalagens de papelão com um recorte picotado. "Aperte aqui", diz um aviso. Aperto e não acontece nada. Depois de inúmeras tentativas, arrebento o papelão no lugar errado. O suco esguicha para o copo pelo lado. Um horror.

Engoli derrotas até de embalagens de produtos de limpeza. Algumas vêm com uma tampa simples. Aberta, descobre-se uma nova tampa. O lugar onde devia haver um furinho está tapado com plástico resistente. Tudo bem. E uma medida natural do fabricante para impedir que o detergente alague o caminhão de entrega. Mas a tampa é planejada numa medida tal que nada consegue fazer o furinho. A ponta das facas não penetra. Nem a da tesoura de cozinha. Tento com um garfo. A dimensão é perfeita. Quase consigo. Empurro um dente do garfo no plástico. Entorta para o lado, mas não faz o furinho. Fico com o garfo destruído e a embalagem fechada. Paro alguns segundos. Tomo um café. Cravo chaves de fenda de tamanhos variados. Nenhuma serve. Lembro-me do abridor de vinhos. Tenho um superchique, de design italiano, que reservo para os dias de visita. Quase acabo com o abridor, mas consigo. Furinho feito, vou lavar os pratos. Espremo a embalagem e o produto sai por todos os lados. As várias tentativas criaram pequenas aberturas. Espirra até no armário da cozinha. Minha orelha fica cheia de detergente.

Estou consciente de que os fabricantes têm sólidas razões para me torturar dessa maneira. Proteger o produto é uma delas. Impedir que crianças abram frascos indevidos é outra. Nesse último caso, trata-se de pura ilusão. Petiscos em saquinhos metálicos indevassáveis e bugigangas eletrônicas treinaram a meninada. Para minha humilhação, qualquer garotinho abre uma embalagem complexa em segundos. Eu me sinto como se fosse um alienígena, ainda não adaptado para conviver com os progressos da civilização. Tenho saudade das embalagens do passado. Quando bastava um pouco de firmeza para torcer tampas ou usar o abridor de latas. Força, só para estourar a rolha da garrafa de champanhe. Mas, aí, sempre valia a pena, por conta da comemoração.

Entendendo o texto

01. O que o autor faz ao entrar no chuveiro e tentar usar o novo xampu?

a. Ele escorrega no chão molhado.

b. Ele consegue abrir facilmente a embalagem.

c. Ele luta para remover o plástico que envolve a tampa.

d. Ele decide tomar um banho quente.

   02. Qual foi o resultado da tentativa do autor de abrir uma lata de patê de fígado com uma chavinha?

         a. Ele conseguiu abrir facilmente.

         b. Ele derramou o patê no chão.

         c. Ele cortou a mão.

         d. Ele compartilhou o patê com os amigos.

   03. Qual é a conclusão irônica do autor sobre frascos, latas e embalagens?

        a. Eles são muito fáceis de abrir.

        b. Eles indicam a saúde do consumidor.

        c. Eles são projetados para serem resistentes.

        d. Eles revelam a habilidade manual das pessoas.

   04. Que dificuldade o autor enfrenta ao tentar abrir embalagens de remédios e vitaminas?

         a. As embalagens têm uma seta minúscula que precisa ser alinhada.

          b. As embalagens estão seladas com plástico resistente.

          c. As embalagens exigem uma força excessiva para abrir.

          d. As embalagens têm instruções confusas.

     05. Qual é a experiência frustrante do autor ao tentar abrir embalagens de suco em papelão?

          a. Ele acaba rasgando o papelão no lugar errado.

          b. Ele não consegue encontrar o local para apertar.

          c. Ele derrama o suco fora do copo.

          d. Ele engole o suco acidentalmente.

      06. Por que o autor enfrenta dificuldades ao abrir embalagens de produtos de limpeza?

          a. As embalagens são muito grandes.

          b. As tampas estão seladas com plástico resistente.

          c. As embalagens estão danificadas.

          d. As embalagens são muito leves.

      07. Qual é o motivo citado pelo autor para a complexidade das embalagens?

          a. Proteger o produto.

          b. Facilitar a abertura para crianças.

          c. Impedir o uso indevido do produto.

          d. Atender às necessidades dos adultos.

        08. Como o autor se sente em relação à habilidade das crianças em abrir embalagens complexas?

       a. Surpreso.

       b. Orgulhoso.

       c.  Humilhado.

       d.  Aliviado.

     09. O que o autor expressa sentir falta no final da crônica?

       a. Embalagens modernas.

       b. Rolhas de garrafas de champanhe.

       c. Comemorações especiais.

       d.  Embalagens simples do passado.

   10. Qual é a mensagem principal transmitida pelo autor na crônica "Vítima das Embalagens"?

       a. A necessidade de inovação nas embalagens.

       b. O desejo de preservar as tradições antigas.

      c. A frustração causada por embalagens modernas complexas.

      d. A importância de cuidar da saúde ao consumir produtos.

quinta-feira, 25 de abril de 2024

CRÔNICA: PALAVRINHA PERIGOSA - WALCYR CARRASCO - COM GABARITO

 Crônica: Palavrinha Perigosa

               Walcyr Carrasco

  Visito uma amiga, dona de um antiquário. Detalhe: ela mora na parte de cima da loja. Para minha surpresa, nesse sábado, meio da tarde, parece haver uma festa no pátio. Várias pessoas bebem cerveja e comem bolinhos de bacalhau, fritos por uma senhora portuguesa, vizinha da loja. Um rapaz faz drinques e sucos. Minha amiga se apressa a me receber.

 Fonte:https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjLAZak3A6BslxwYIcQGYJenkAaL9XtFEVEyu6UVKuDT1z0LT0Bq4hkeZYWs2Q84XRmp5LiJhcxmf5R73HciYLa3kfCmsrxHRJel0keEvBimOB83O7bDrusijGAb1oLZ3q9Y1-Hf18Xesz73o4u8a-Au2XiDTG3s_Wl4qAt1RW5gokRuv1rjtEejFYfpN0/s320/ACEITAR.jpg


— Aceita uma cerveja? Ou prefere um suco?

Aceito, é claro. Um suco geladinho, delicioso. Como alguns bolinhos de bacalhau. Entro no papo. Dali a algum tempo, resolvo me despedir. Sorrio, grato pela tarde deliciosa.

— Bem, vou indo....

Imediatamente, ela saca um bloquinho, a caneta, e começa a fazer as

contas.

— Deixa ver. Você tomou um suco... ou foram dois? Quantos bolinhos de bacalhau?

A senhora portuguesa grita:

         — Seis! Ele comeu seis!       :

Bem, eu comi seis pensando que fosse de graça! Arranco algumas notas do

bolso, desenxabido. Ela recebe, feliz da vida.

— Volte sábado que vem.

É o drama da palavra "aceita". Ah, palavrinha perigosa!

Conheci uma jovem que veio do interior estudar. Vida difícil, morando em pensionato. Um dia resolveu fazer uma extravagância. Saiu com umas amigas, estudantes como. ela, para jantar fora. Sentaram-se no restaurante. Nenhuma tinha experiência de cidade grande. Veio o garçom.

— Aceitam uma entrada?

—Aceitamos!

— Aceitam um vinho?

— Oh, sim, aceitamos!

E foram aceitando. Certas de que fosse uma gentileza, já que ninguém estava falando em dinheiro. No final veio a conta. Quase morreram de susto. Passaram o mês comendo ovo com pão. 

O verbo aceitar acabou se tornando uma forma disfarçada de empurrar a mercadoria sem discutir o preço. O correto seria o garçom ter oferecido a carta de vinhos.

Em tempos bicudos, as coisas ficam ainda mais difíceis. Recentemente fui à casa de um amigo na Vila Madalena. Artesão. Mal entrei, ele lembrou.

— Ainda não dei seu presente de aniversário! Está guardado.

Foi para dentro, voltou com uma caixinha de madeira enfeitada com flores

do tipo que detesto. Sorriu e disse:     

— Que acha? Gosta?

-— É... linda!     

— Quer ficar com ela?

— Claro!

Afinal, o que se diz diante de um presente? Mas a coisa não era bem assim.

Saltitante, ele entrou no quarto. Voltou com um pacote.

— Este é seu presente.

— Ahnnn?

Desembrulho uma camiseta, atônito. Ele continua:

— Pela caixinha, vou fazer um preço especial!

E manda ver! Que tática, hein? Como voltar atrás, ainda por cima sendo uma obra assinada pelo próprio? Deu vontade de atirar a caixinha na cabeça dele.

Uma amiga, que mora em um bairro de classe média tradicional da cidade, anda apavorada. Diante da crise que assola as melhores famílias, a maioria das vizinhas partiu para negócios domésticos. Uma faz massas em casa. Outra, doces e bolos. As visitas amigáveis de antigamente transformaram-se em armadilhas.

—- Não quer levar uma lasanha para casa?

A ingênua caiu na conversa algumas vezes. Logo depois de embrulhada a massa, ou a bandeja de docinhos, vinha o preço.

— Mas... mas...

Nos bons tempos, bastava devolver o prato com outra gulodice. Minha amiga desenvolveu uma tática.

— Estou de regime.

Ninguém acredita, é claro. Continua gordíssima. Mas com o dinheiro no

bolso.

 Eu optei pela franqueza.

— Não aceito não.

— Mas está tão gostoso.

— Não quero, não quero e não quero!

Vou acabar passando por mal-educado. Mas do jeito que as coisas vão,

ficou perigoso aceitar até presente de aniversário.

 Entendendo o texto

01. Qual é o principal tema abordado na crônica "Palavrinha Perigosa" de Walcyr Carrasco?

a.   Experiências gastronômicas.

b.   Os desafios de viver na cidade grande.

c.   A arte de presentear.

d.   Os mal-entendidos causados pelo verbo "aceitar".

02. Qual é a situação inicial descrita pelo autor ao visitar a amiga no antiquário?

a. Uma festa de aniversário.

b. Uma degustação de vinhos.

c. Um encontro casual.

d. Um evento de venda de antiguidades.

     03. O que acontece quando o autor menciona que vai embora após a festa?

         a. Ele é cobrado pelos gastos que teve.

         b. Ele recebe presentes inesperados.

         c. Ele é convidado para outra festa.

         d. Ele é elogiado pela sua presença.

   04. Qual é o exemplo dado pelo autor sobre o uso perigoso da palavra "aceitar" em um restaurante?

         a. Uma jovem pede diversos pratos sem saber o preço.

         b. Um grupo de amigos é surpreendido com uma conta alta após aceitar vários itens.

         c. Um garçom oferece gentilezas que no final se revelam caras.

          d. Um restaurante oferece promoções falsas aos clientes.

  05. O que o autor descobre ao aceitar um presente de aniversário de um amigo artesão?

         a. O presente era um objeto valioso.

         b. O presente era uma caixa vazia.

         c. O amigo queria vendê-lo por um preço especial.

         d. O amigo esperava uma reação negativa.

 06. Como as visitas amigáveis se transformaram em armadilhas no bairro da amiga do autor?

         a. Os vizinhos começaram a se afastar uns dos outros.

         b. As vizinhas passaram a oferecer alimentos com preços ocultos.

         c. As visitas se tornaram cada vez mais frequentes.

         d. As vendas de massas e doces aumentaram.

   07. Qual é a estratégia desenvolvida pela amiga do autor para lidar com as ofertas indesejadas de comida?

          a. Ela alega estar de dieta.

          b. Ela recusa educadamente.

          c. Ela finge não estar em casa.

          d. Ela aceita e depois devolve os alimentos.

    08. Por que o autor considera perigoso aceitar até presentes de aniversário?

         a. Porque geralmente são presentes caros.

         b. Porque podem vir acompanhados de cobranças ou vendas ocultas.

          c. Porque os presentes podem ser de má qualidade.

          d. Porque os presentes podem ser indesejados.

   09. Qual é o sentimento principal transmitido pelo autor em relação às mudanças nas relações sociais devido às dificuldades econômicas?

          a. Contentamento.

          b. Confusão.

          c. Desconfiança.

          d. Preocupação.

   10. Qual é a mensagem central que o autor deseja transmitir com a crônica "Palavrinha Perigosa"?

         a. A importância de aceitar presentes generosos.

         b. A necessidade de ser franco ao recusar ofertas.

         c. Os perigos de assumir compromissos sem entender as consequências.

         d. As vantagens de viver em uma cidade grande.