Texto: A NOVA E A VELHA ÁFRICA
“Há sempre algo de novo em África”, disse o escritor romano Plínio. O aparecimento de novos Estados africanos nas últimas décadas origina frequentemente notícias de primeira página nos jornais, mas as tradições deste continente são tão antigas como quaisquer outras, e algumas das mais remotas formas de vida humana foram recentemente descobertas no vale do Grande Rift, na África Oriental. Existem ainda sobreviventes das raças de pigmeus e bosquímanos, povos dos mais antigos da história humana. E, por detrás das modernas doutrinas políticas, há inúmeros mitos e lendas que constituem parte fundamental da maneira de pensar das populações africanas.
A África é um vasto continente, que se
divide naturalmente em duas partes principais. O chamado Norte de África, que
se estende do Egipto a Marrocos, e da foz do Nilo até à Etiópia, pertence na
sua maior parte ao mundo mediterrânico e tem como religiões básicas o
Cristianismo e o Islamismo, que determinam mentalidades e histórias próprias. O
deserto do Saara e as florestas tropicais formavam uma barreira intransponível
aos europeus, que procuravam conhecer o resto da África, até que os
portugueses, na saga dos descobrimentos, contornaram o cabo da Boa Esperança,
no final do século XV.
[...]
As mitologias grega e indiana são
apoiadas por vasta literatura, nascida de tradições orais preservadas em
livros, escritos ao longo dos séculos. Para se ficar a conhece-las, é
suficiente ler essas obras. No estudo da mitologia africana surge logo à partida
um obstáculo de monta: não há livros antigos. Há incontáveis histórias, já que
todas as raças africanas adoram conta-las, mas que nunca foram passadas ao
papel até aos tempos modernos. E mesmo as coleções hoje existentes estão
incompletas.
[...]
Como a arte era a única “escrita”
conhecida em toda a África Tropical, foi usada para interpretar a vida em todos
os seus aspectos. Foi aplicada na vida religiosa, que aliás não se dissociava
de outras facetas da vida, para dar significado e função espiritual a objetos
destinados em cerimónias ou mesmo em ritos individuais. Foi usada para ilustrar
provérbios e para expressar a sabedoria popular. Deste modo, a arte africana
proporciona uma espécie de literatura sacra, realçando a beleza e a solenidade
da face do homem. É profundamente expressiva e, no entanto, modesta. Não
existem grandes templos desafiando os céus, pois a falta de pedras macias e a
inexistência de explosivos para quebrar as rochas graníticas eram realidades
inelutáveis. A arte africana preocupa-se com a vida humana: os rostos e imagens
retratam a natureza do homem e as suas atividades. O homem e a mulher como um
casal, às vezes como gémeos, indicam o núcleo da família africana; mesmo quando
a poligamia é prática corrente, o casal continua a ser a unidade básica. A
interdependência entre o homem e a mulher é fielmente retratada, tanto na
escultura como na mitologia.
Geoffrey Parringer.
África; Biblioteca dos grandes mitos e lendas universais. Trad. Raul de Sousa
Machado. Lisboa: Verbo, 1987. p. 7-9.
Fonte: Português em outras palavras –
8ª série – Maria Sílvia Gonçalves – ed. Scipione – São Paulo, 2002. 4ª edição.
p. 50-2.
Entendendo o texto:
01 – Qual a grande
contradição atual do continente africano?
A convivência simultânea do antigo
(mitos, lendas, maneiras de pensar) com o moderno (novas doutrinas políticas).
02 – Que descobertas
recentes obrigaram o mundo ocidental a repensar seu preconceito contra a
África?
As mais remotas formas de vida humana
foram encontradas em escavações na África.
03 – Veja a frase: “Por ser
uma sociedade ágrafa, a África não pôde preservar suas tradições”. Você
concorda com essa afirmação? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Não, uma vez que, mesmo não tendo escrita, a cultura
africana preservou-se por meio da oralidade ou da arte.
04 – Qual o papel da arte na
cultura africana?
A arte tornou
possível a interpretação da vida africana em todos os seus aspectos.
05 – O que o caráter humanístico
da arte africana nos revela sobre esse povo?
A beleza, a
grandeza do africano está na sua simplicidade e religiosidade.
06 – “Traduza” a palavra poligamia a partir dos radicais
gregos que a compõem.
Poli = muitos; gamia = casamento.
07 – O que os adjetivos intransponível e inelutável têm em comum? O que
poderia facilitar a compreensão do significado dessas palavras?
Ambos têm prefixo
in-, indicando negação, e sufixo –vel, indicando possibilidade de praticar ou
sofrer uma ação. Detendo-nos no radical, poderíamos entender as palavras como:
intransponível = o que não pode ser transposto; inelutável = aquilo contra o
que não se pode lutar.
08 – Encontre no texto uma
palavra cujo plural não segue a orientação geral e não aparece no final.
Procure descobrir como essa palavra se formou para entender o plural diferente.
A palavra quaisquer tem plural em seu
interior e não no final porque é formada pelo pronome qual (que faz
plural quais), seguido do verbo querer conjugado no presente do
indicativo.
09 – Você já trabalhou com
textos expositivos nas séries anteriores. Já sabe, portanto, que determinadas
construções são comuns nesse tipo de texto. É o caso de frases formadas com o
verbo haver, empregado com o
sentido de existir, e com
verbos na voz passiva. Identifique no texto frases em que isso ocorre e
explique em seu caderno as razões do emprego desse tipo de construção.
“... há inúmeros mitos e lendas que
constituem...”; “Há incontáveis histórias ...”; “Foi usada para interpretar a
vida”; “Foi aplicada na vida religiosa ...”.
Nos textos expositivos, costumam-se
afirmar fatos sem atribuí-los a um sujeito gramatical, como se eles tivessem
vida própria. Daí o emprego constante do verbo haver, no sentido de existir. O
emprego do sujeito paciente, na voz passiva, também se justifica pelo fato de
não se julgar importante citar o agente da ação, frequentemente omitido nesse
tipo de construção sintática.
10 – O trecho do livro
“África” que você leu foi traduzido em Portugal.
a) Identifique nele uma construção típica da sintaxe lusitana.
“Para se ficar a conhece-las, é suficiente ler essas obras”.
b) Reescreva-a de forma abrasileirada.
No Brasil, seria mais comum dizer-se: Para que se possa conhece-las,
é suficiente ler essas obras.
11 – Você conhece palavras
pertencentes ao português de Portugal que não são aqui utilizadas ou que no
português do Brasil têm outro significado? Cite algumas, se souber.
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Bicha no lugar de fila; Autocarro no lugar de ônibus;
Autogolo que para nós é gol contra; Pastilhas elásticas é chiclete; Rebuçado é
pirulito; Capachinho é peruca e Papai Natal é Papai-Noel.
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