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domingo, 26 de junho de 2022

REPORTAGEM: MARINA: DO SERINGAL AO SENADO - MÁRCIA TURCATO - COM GABARITO

 Reportagem: Marina: do seringal ao senado

                     Márcia Turcato

        Aos 37 anos recém-completados, tendo sobrevivido a cinco crises de malária, três hepatites e uma infância desgraçadamente pobre e trabalhosa num remoto seringal no Acre, a senadora Marina Silva (PT – AC) tinha tudo para estar no bagaço. Bagaço, aliás, era o nome do seringal onde se criou, terceira de 12 filhos, mãos-de-obra enjeitada numa atividade pesada e predominantemente masculina.

        Mas o destino, que a pôs no mundo pelas portas do inferno verde da Amazônia, traçou para Marina planos inesperadamente grandes. Hoje, embelezada e fortalecida pelas surpreendentes vitórias que vem conquistando, Marina é um ser aparentemente delicado em seus 50 quilos distribuídos por 1,622 metro de altura. Só aparência. Ela não leva mais o peso da borracha, mas carrega o fardo da responsabilidade de dar melhores condições de vida aos 65 mil acreanos que votaram nela nas últimas eleições – a maior votação da história do Acre – e a outros milhares que continuam no bagaço na faina diária e insana dos seringais.

        “Minha missão é defender todos os excluídos e trabalhar pelo desenvolvimento sustentado da Amazônia”, diz ela, num tom firme adquirido nos tempos de militância política ao lado do seringueiro Chico Mendes, mas com a suavidade de quem sabe o que busca.

        A saga da senadora acreana tem proporções amazônicas. Seus relatos de infância são instantâneos de miséria explícita, recheados de doença e morte. Marina só descobriu a existência de um mundo além das seringueiras aos nove anos, quando seu pai foi tentar a sorte e um emprego em Manaus. Foi uma descoberta fugaz. Devido ao insucesso da tentativa paterna, a futura senadora acabou voltando ao Bagaço, onde passou o resta da infância e início da adolescência convivendo com problemas respiratórios decorrentes do desumano processo de defumação na preparação da borracha. Foi nessa fase que teve os piores problemas de saúde, aos quais resistiu por pura providência divina, na medida em que não havia nenhum médico nas imediações. Do Bagaço ela só saiu aos 16 anos, quando já tinha perdido duas irmãs para a malária e para o sarampo, além da mãe, dona Maria Augusta, vítima de um aneurisma cerebral.

        0s 20 anos que se seguiram marcaram a grande, virada em sua vida. Trabalhando como doméstica, aprendeu a ler no Mobral e revelou-se uma estudante acima da média ao completar o segundo grau apenas seis anos depois de ser alfabetizada. Os novos conhecimentos fizeram com que ela desistisse do antigo sonho de ser freira e optasse por tornar-se estudante de História na Universidade Federal do Acre. A explosiva mistura de um passado triste na extração do borracha com a efervescência universitária nos estertores da ditadura militar fizeram de Marina uma militante política de esquerda que, nos anos seguintes, liderou diversos movimentos contra a derrubada indiscriminada da floresta amazônica, já estão ao lado do amigo e companheiro Chico Mendes, que mais tarde seria assassinado.

        “Chico e Mary [a antropóloga Mary Allegretti, que divulgou a luta dos seringueiros no Brasil e no exterior] conseguiram grandes avanços na demarcação das áreas para o extrativismo, que é uma boa saída para a região Norte”, relembra Marina. E emenda: “Essa vai ser uma das minhas principais bandeiras de luta no Senado”.

        Quando fala de seus planos, o tom que ela usa volta a ser inflamado como o dos tempos em que se tornou a vereadora mais votada de Rio Branco e, mais tarde, deputada estadual. Sem contudo perder a singeleza de quem cresceu no meio do povo mais sofrido da Amazônia. Ainda ambientando-se na aridez de Brasília, onde instalou-se com o segundo marido e as duas menores de seus quatro filhos, a senadora garante que está pronta para enfrentar, em nome de seus ex-companheiros de Bagaço, a batalha pela preservação da Amazônia.

        “Quero legislar em defesa da mata e criar mecanismos que defendam o seringueiro, que ainda vive quase escravizado”, conclui sintetizando em poucas palavras suas metas para este primeiro mandato. E, a julgar pela sua irresistível ascensão, o primeiro mandato da senadora Marina é apenas mais um passo em direção a destinos ainda maiores. Profecia, aliás, já feita pela revista americana Time, que incluiu Marina Silva em sua lista de cem possíveis lideranças mundiais do futuro, uma seleta relação dos destaques da política que estão na casa dos 30 anos. Para quem já esteve no Bagaço, Marina definitivamente deu a volta por cima.

                   Márcia Turcato. Marina: do seringal ao Senado. Os caminhos da Terra. Ano 4, n° 3. São Paulo: Azul, mar. 1995. p. 30-1.

Fonte: Português em outras palavras – 8ª série – Maria Sílvia Gonçalves – ed. Scipione – São Paulo, 2002. 4ª edição. p. 106-8.

Entendendo a reportagem:

01 – Qual destas atividades Marina não exerceu: senadora, deputada, vereadora, doméstica, estudante, militante de esquerda, antropóloga, ecologista, seringueira?

      Antropóloga.

02 – Esse texto é uma biografia ou um perfil? Qual a diferença entre ambos?

      Trata-se de um perfil. A biografia costuma ser mais “comportada” limitando-se a fazer um relato dos fatos mais importantes da vida de uma pessoa, em ordem cronológica.

03 – Observe as primeiras linhas do texto. Por que a autora o inicia dando ao leitor essas informações?

      Ela inicia o parágrafo com a idade de Marina para realçar o fato de que ela é muito jovem para exercer a função de senadora. Fala da infância miserável da jovem senadora para valorizar ainda mais sua vitória.

04 – Que palavra inicia o segundo parágrafo? Qual sua função no texto?

      Mas. A função é mostrar que, contrariando o que se poderia esperar para uma pessoa que teve a infância de Marina, ela se tornou uma vencedora.

05 – A autora intercala às suas afirmações algumas falas da senadora.

a)   Como é possível identifica-las?

Por meio das aspas.

b)   Como ela encaixou essa falas em seu texto?

Misturando-as estrategicamente com dados que mostram a vida das pessoas que a elegeram e que esperam dela algo que possa ajuda-los.

c)   Qual será a possível reação dos eleitores da senadora diante dessas falas?

Eles, provavelmente, as aprovarão; não se arrependerão do voto.

06 – A autora chega a afirmar que Marina só não morreu por providência divina. Você concorda com ela? Por quê?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Considerar, contudo, as condições precárias da vida que levou e sua frágil constituição física.

07 – Infância miserável + engajamento político = político verdadeiro. Você acha que esta é a fórmula ideal? Como explicar o desempenho de Marina, considerando que até os 16 anos era analfabeta?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Essa foi a fórmula de que resultou Marina, mas não significa que seja ideal. Sem dúvida sua militância deve ter influenciado sua formação, mas há um enorme esforço pessoal em sua trajetória.

08 – É correto afirmar que a senadora renunciou à vida pessoal para participar da política?

      Não. Ela já se casou duas vezes e tem quatro filhos.

09 – Que informação comprova o fato de que Marina é uma pessoa realmente especial? Em que momento do texto a autora revela essa informação e com que intenção o faz?

      Marina foi incluída numa lista da revista americana Time como uma das cem possíveis lideranças mundiais no futuro. A autora revela isso no final do texto para surpreender o leitor e também para mostrar que a senadora já tem reconhecimento internacional, apesar de toda a sua simplicidade.

10 – O que mais impressionou você na trajetória de Marina? Verifique se o perfil de Marina corresponde ao conceito de cidadão que a classe elaborou.

      Resposta pessoal do aluno.

11 – O que há de especial no título do texto que você estudou?

      A autora escolheu duas palavras que começam com se e poderiam estabelecer alguma relação de semelhança, mas que, do ponto de vista do significado, designam lugares díspares. A expressão: do seringal ao senado mostra o salto de Marina do local onde passou sua infância ao local onde hoje luta para concretizar seus ideais.

12 – A autora usa o nome do local onde Marina se criou para quê? Veja especialmente o último período do texto.

      Para fazer um trocadilho. Bagaço é o nome do seringal onde ela se criou. A própria Marina tinha tudo para estar “no bagaço”, devido à infância que teve.

13 – Observe esta construção:

        “Mas o destino, que a pôs no mundo pelas portas do inferno verde da Amazônia” [...]. Sobre qual relação de semelhança é feita essa metáfora?

      A Amazônia é como um inferno, devido ao sofrimento dos que nela vivem e trabalham. A cor verde é óbvio, refere-se à floresta.

14 – Que recurso a autora usou em: “Ela não leva mais o peso da borracha, mas carrega o fardo da responsabilidade”? Faça um comentário sobre a linguagem utilizada pela autora.

      Opôs duas expressões, sendo a primeira usada no sentido literal e a segunda, no sentido figurado: peso / fardo; borracha / responsabilidade.

15 – Dê um sinônimo para as expressões destacadas.

a)   “A saga da senadora acreana tem proporções amazônicas”.

Dimensões imensas.

b)   “Essa vai ser uma das minhas principais bandeiras de luta”.

Lemas.

c)   “Ainda ambientando-se na aridez de Brasília...”.

Frieza.

16 - O que essas palavras têm de especial? O que têm em comum?

      São palavras usadas com um sentido diferente do que lhes é usual. São usadas metaforicamente.

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