Reportagem: Filhos invertem papéis e
patrulham pais
Cláudia
Fontoura
Basta o empresário Ivan Frug, de 40
anos, pegar o maço de cigarros para que seus filhos Pedro, de 15 anos, Gabriel,
de 13, e Manuela, de 5, comecem uma encenação. Se estavam rindo, passam a fazer
caretas e fingem que se sentem mal e com tosse. “Antes de acender o cigarro, preciso
me esconder na varanda para evitar reclamações”, conta ele. “É o único lugar
onde ele pode fumar”, avisa Gabriel.
A patrulha dos Frug se repete em outras
famílias. Há filhos que policiam as saídas noturnas, os namorados e o modo de
se vestir dos pais. Nem mesmo a quantidade de café que consomem por dia escapa.
Preocupação com a saúde, ciúme e a necessidade de controlar os gostos dos pais
são os motivos da vigilância, que não é relaxada nem no Dia da Criança. Pelo
contrário. É uma época de reforçar as cobranças.
Os irmãos Frug detestam cigarro.
Incansáveis nas tentativas de convencer o pai a deixar o vício, os meninos
decidiram delimitar a área de fumantes da casa. “No nosso quarto ele não entra
com cigarro e só fuma nos outros lugares se não estivermos perto”, diz Gabriel.
Com a professora Valéria Moura da
Costa, o controle é outro. Seu filho Felipe, de 11 anos, fica uma fera por
causa da quantidade de café que ela toma. Valéria teve de reduzir o consumo.
“Eu tomava seis cafezinhos por dia e diminui para dois”.
Felipe tem um motivo que considera
concreto para vigiar a mãe. “O café estraga o estômago e ela passa mal”, diz.
Para evitar que Valéria tenha dores de estômago, Felipe já fez de tudo. “Até
joguei o café na pia”, conta. “Ela ficou muito brava”.
Brega
– A roupa que a mãe ou o pai vão vestir também é um forte motivo para que
alguns filhos sintam-se no direito de criticar. Saia curta demais, peças bregas,
enfeitadas ou decotadas são os argumentos mais usados para fazer a mãe voltar
ao guarda-roupas em busca de outra produção.
Quase todos os dias, antes de sair para
o trabalho, a professora Vera Busch Rigo Neves Bezerra enfrenta as críticas da
filha Carolina, de 16 anos. “Mãe, você não tem uma roupinha mais básica?”,
pergunta Vera, imitando a filha. “Para ela, tenho de usar jeans, camiseta e
tênis”.
Vera não é uma pessoa extravagante, mas
Carolina detesta os acessórios que a mãe insiste em usar. “Ela usa brincos
maiores do que ela mesma”, implica Carolina. “Fica muito brega”. Para Vera, não
é fácil agradar aos filhos. “O que eles acham bonito não combina com o meu modo
de ser”.
Camila Militello, de 12 anos, está
segura do bom gosto da mãe, Telma Anauate, mas fica atenta a suas minissaias. Se
Telma abusa do comprimento, a filha é categórica. “Ela diz que fica ridículo e
que eu não deveria sair de casa daquele jeito”, conta a mãe. “Acho que fico com
ciúme porque ela chama atenção”, justifica Camila.
A administradora de empresas Rosaura de
Oliveira enfrenta patrulha um pouco mais complicada. A filha Fernanda, de 7
anos, é capaz das maiores cenas para deixar claro que não está disposta a ver a
mãe namorando. “Quando recebo a visita de um namorado, ela não o cumprimenta e
ainda faz cara feia”. Sair à noite para ir ao cinema ou jantar com amigos
também aborrece a menina. “Se pudesse, ela me trancaria na gaveta”.
Para Fernanda, a mãe só deveria se
interessar por programas que a incluam e a palavra namorado deveria ser cortada
do vocabulário. “Não gosto que ela namore, pois fico com ciúmes”. Rosaura
acredita que Fernanda esteja passando por uma fase comum da infância e tenta
lidar com o problema com paciência e carinho. “Acho comum os filhos sentirem
necessidade de exclusividade nessa fase”, diz. “Procuro explicar e não deixo de
fazer o que tenho vontade”.
O Estado de São
Paulo, 8 out. 1995.
Fonte: Português
– Linguagem & Participação, 5ª Série – MESQUITA, Roberto Melo/Martos,
Cloder Rivas – Ed. Saraiva, 1999, p. 215-7.
Entendendo a reportagem:
01 – De acordo com o texto,
qual o significado das palavras abaixo:
·
Encenação: ato de agir como se estivesse representando no palco.
·
Policiar: fiscalizar, regular ou manter em ordem.
·
Relaxado: descuidado, negligente, desmazelado.
·
Incansável: ativo, laborioso; infatigável.
·
Delimitar: fixar os limites de, demarcar.
·
Concreto: relativo a realidade, real, efetivo; material de construção
feito com cimento, areia, pedra britada e água.
·
Brega: diz-se da pessoa ou coisa que revela mau gosto; deselegante,
fora de moda, “cafona”.
·
Exclusividade: especial, privativo, restrito.
02 – O texto que você leu é
uma reportagem ou uma notícia?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: É uma reportagem, pois não apresenta um fato que seja
notícia, mas sim expõe um assunto.
03 – Qual é o tema?
O relacionamento
entre pais e filhos hoje em dia e a dificuldade dos pais em respeitar os
desejos dos filhos, sem passar por cima dos seus próprios.
04 – O que existe de curioso
no comportamento dos filhos no texto?
O curioso é que
os filhos buscam controlar a vida dos pais, quando habitualmente acontece o
contrário.
05 – Na sua opinião, os
filhos estão certos ao chamar a atenção dos pais? Faça um comentário a
respeito.
Resposta pessoal do aluno.
06 – Quais as atitudes que
você condenaria nos pais presentes no artigo? Por quê?
Resposta pessoal
do aluno.
07 – Você faz com seus pais
o mesmo que as crianças do texto? Como eles reagem aos seus comentários?
Resposta pessoal
do aluno.
08 – O que você acha do
comportamento dessas crianças?
Resposta pessoal
do aluno.
09 – Crie outro título para
esse texto.
Resposta pessoal
do aluno.
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