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quarta-feira, 4 de setembro de 2019

CRÔNICA: DA UTILIDADE DOS ANIMAIS - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - COM GABARITO

CRÔNICA: DA UTILIDADE DOS ANIMAIS
                  Carlos Drummond de Andrade
Terceiro dia de aula. A professora é um amor. Na sala, estampas coloridas mostram animais de todos os feitios. É preciso querer bem a eles, diz a professora, com um sorriso que envolve toda a fauna, protegendo-a. Eles têm direito à vida, como nós, e além disso são muito úteis. Quem não sabe que o cachorro é o maior amigo da gente? Cachorro faz muita falta. Mas não é só ele não. A galinha, o peixe, a vaca… Todos ajudam.
– Aquele cabeludo ali, professora, também ajuda?
– Aquele? É o iaque, um boi da Ásia Central. Aquele serve de montaria e de burro de carga. Do pêlo se fazem perucas bacanas. E a carne, dizem que é gostosa.

– Mas se serve de montaria, como é que a gente vai comer ele?
– Bem, primeiro serve para uma coisa, depois para outra. Vamos adiante. Este é o texugo. Se vocês quiserem pintar a parede do quarto, escolham pincel de texugo. Parece que é ótimo.
– Ele faz pincel, professora?
– Quem, o texugo? Não, só fornece o pêlo. Para pincel de barba também, que o Arturzinho vai usar quando crescer.
Arturzinho objetou que pretende usar barbeador elétrico. Além do mais, não gostaria de pelar o texugo, uma vez que devemos gostar dele, mas a professora já explicava a utilidade do canguru:
– Bolsas, mala, maletas, tudo isso o couro do canguru dá pra gente. Não falando da carne. Canguru é utilíssimo.
– Vivo, fessora?
– A vicunha, que vocês estão vendo aí, produz… produz é maneira de dizer, ela fornece, ou por outra, com o pêlo dela nós preparamos ponchos, mantas, cobertores, etc.
– Depois a gente come a vicunha, né fessora?
– Daniel, não é preciso comer todos os animais. Basta retirar a lã da vicunha, que torna a crescer…
– A gente torna a corta? Ela não tem sossego, tadinha.
– Vejam agora como a zebra é camarada. Trabalha no circo, e seu couro listrado serve para forro de cadeira, de almofada e para tapete. Também se aproveita a carne, sabem?
– A carne também é listrada?- pergunta que desencadeia riso geral.
– Não riam da Betty, ela é uma garota que quer saber direito as coisas. Querida, eu nunca vi carne de zebra no açougue, mas posso garantir que não é listrada. Se fosse, não deixaria de ser comestível por causa disto. Ah, o pingüim? Este vocês já conhecem da praia do Leblon, onde costuma aparecer, trazido pela correnteza. Pensam que só serve para brincar? Estão enganados. Vocês devem respeitar o bichinho. O excremento – não sabem o que é? O cocô do pingüim é um adubo maravilhoso: guano, rico em nitrato. O óleo feito da gordura do pingüim…
– A senhora disse que a gente deve respeitar.
– Claro. Mas o óleo é bom.
– Do javali, professora, duvido que a gente lucre alguma coisa.
– Pois lucra. O pêlo dá escovas é de ótima qualidade.
– E o castor?
– Pois quando voltar a moda do chapéu para os homens, o castor vai prestar muito serviço. Aliás, já presta, com a pele usada para agasalhos. É o que se pode chamar de um bom exemplo.
– Eu, hem?
– Dos chifres do rinoceronte, Belá, você pode encomendar um vaso raro para o living da sua casa.
Do couro da girafa Luís Gabriel pode tirar um escudo de verdade, deixando os pêlos da cauda para Tereza fazer um bracelete genial. A tartaruga-marinha, meu Deus, é de uma utilidade que vocês não cauculam. Comem-se os ovos e toma-se a sopa: uma de-lí-cia. O casco serve para fabricar pentes, cigarreiras, tanta coisa. O biguá é engraçado.
– Engraçado, como?
– Apanha peixe pra gente.
– Apanha e entrega, professora?
– Não é bem assim. Você bota um anel no pescoço dele, e o biguá pega o peixe mas não pode engolir. Então você tira o peixe da goela do biguá.
– Bobo que ele é.
– Não. É útil. Ai de nós se não fossem os animais que nos ajudam de todas as maneiras. Por isso que eu digo: devemos amar os animais, e não maltratá-los de jeito nenhum. Entendeu, Ricardo?
– Entendi, a gente deve amar, respeitar, pelar e comer os animais, e aproveitar bem o pelo, o couro e os ossos.
(Texto extraído de Drummond, Carlos de. De notícias e não notícias faz-se a crônica. Rio de Janeiro, José Olympio, 1975)
Fonte: Livro: Português Linguagens – 6º ano – São Paulo: Atual, 2009. p.180/181.
Compreensão e interpretação

1)   O texto retrata uma situação vivida numa sala de aula.

a)   De que disciplina você imagina que seja essa aula? Por quê?
Provavelmente de Ciências, pois é a disciplina que normalmente aborda situações que dizem respeito ao meio ambiente.

b)   Em que cidade provavelmente ocorre essa aula? Que palavra do texto justifica sua resposta?
No Rio de Janeiro, pois é mencionada a praia do Leblon.

2)   No início do texto, a professora afirma aos alunos que é preciso querer bem os animais. Para justificar sua afirmação, ela apresenta dois motivos.

a)   Quais são eles?
O direito dos animais à vida (“Eles têm direito à vida”) e a utilidade deles (“são muito úteis”).

b)   Considerando-se as explicações da professora, qual desses motivos parece ser mais importante para ela? Justifique sua resposta.
É a utilidade dos animais, pois ela usa a maior parte do tempo para explicar a utilidade do canguru, da tartaruga marinha, entre outros animais.

3)   A professora considera o biguá “engraçado”, por causa do modo como é utilizado pelos homens para apanhar peixe. Você considera engraçado o que se faz com o biguá? Como  você caracteriza o comportamento do ser humano em relação a esse animal?
Resposta pessoal.
Possível resposta: A palavra engraçado é inadequada para retratar o que se faz com o biguá, já que os seres humanos  agem de modo cruel com esse animal.

4)   Os dois últimos parágrafos sintetizam as ideias do texto.

a)   Qual é a opinião da professora a respeito dos animais?
Ela expressa a opinião de que “devemos amar os animais, e não maltratá-los de jeito nenhum”.

b)   O que mostra o comentário de Ricardo?
Mostra que ele percebeu as contradições existentes na fala da professora, pois, se as pessoas devem amar e respeitar os animais, por que então pelam, comem e aproveitam o pelo, o couro e os ossos?



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