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quinta-feira, 26 de setembro de 2024

CONTO: TERRAS DO SEM-FIM - (FRAGMENTO)- JORGE AMADO - COM GABARITO

 Conto: Terras do Sem-Fim – Fragmento

           Jorge Amado 

        A cidade ficava entre o rio e o mar, praias belíssimas, os coqueiros nascendo ao largo de todo o areal. Um poeta, que certa vez passara por Ilhéus e dera uma conferência, a chamara de “cidade das Palmeiras ao vento” numa imagem que os jornais repetiam de quando em vez.

Fonte: https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizoI5CMH4tsgz9y6_GWO69fzzhmgs6o0HPafMsJ0o4cAr4jOorRI2-MqsJQNEddza4dUoidvd35_DRw8zN2L9a22DfbmCWMuYFvB83uEEjg5F7TSlnthOE_REU853tjs7D0C44IJHS_6IgTEHsiiFqOd-vU5JtvQvPybxki7w36fDMSedsEwn_aLLZuPU/s1600/Terras_do_Sem-Fim.jpg


        A verdade, porém, é que as palmeiras nasciam nas praias e se deixavam balançar pelo vento. A árvore que influía em Ilhéus era a árvore do cacau, se bem não visse nenhuma em toda a cidade. Mas era ela que estava por detrás de toda a vida de São Jorge do Ilhéus. Por detrás de cada negócio que era feito, de cada casa que era construída, de cada armazém, de cada loja que era aberta, de cada caso do amor, de cada tiro trocado na rua. Não havia conservação em que a palavra não entrasse como elemento primordial. E sobre a cidade pairava, vindo dos armazéns de depósito, dos vagões da estrada de ferro, dos porões dos navios, das carroças e da gente, um cheiro de chocolate que é cheiro de cacau seco.

        Existia outra ordenança municipal que proibia o porte de armas. Mas muito poucas pessoas sabiam que ela existia e mesmo aqueles poucos que o sabiam, não pensavam em respeitá-lo. Os homens passavam, calçados de botas ou de botinas de couro grosso, a calça cáqui, o paletó de casimira, e por debaixo deste o revólver. Homens de repetição a tiracolo atravessavam a cidade sob a influência dos moradores, Apesar do que já existia de assentado, de definitivo, em Ilhéus, os grandes sobrados, as ruas calçadas, as casas de pedra e cal, ainda assim restava na cidade um certo ar de acampamento. Por vezes, quando chegavam os navios abarrotados de emigrantes vindos do sertão, de Sergipe e do Ceará, quando as pensões de perto da estação não tinham mais lugar de tão cheias, então barracas eram armadas na frente do porto. Improvisavam-se cozinhas, os coronéis vinham ali escolher trabalhadores. Dr. Rui, certa vez, mostrara um daqueles acampamentos a um visitante da capital.

        -- Aqui é o mercado de escravos...

        Dizia com um certo orgulho e certo desprezo, era assim que ele amava aquela cidade que nascera de repente, filho do porto, alimentada pelo cacau, já se tornando a mais rica do estado, a mais próspera também. Existiam poucos ilheenses de nascimento que já tivessem importância na vida da cidade. Quase todos fazendeiros, médicos, advogados, agrônomos, políticos, jornalistas, mestre-de-obras eram gente vinda de fora, de outros estados. Mas amavam estranhamentos aquela terra venturosa e rica. Todos se diziam "grapiúnas" e, quando estavam na Bahia, em toda parte eram facilmente reconhecíveis pelo orgulho com que falavam.

        -- Aquele é um ilheense... – diziam.

        Nos cabarés e nas casas de negócios da capital eles arrotavam valentia e riqueza, gastando dinheiro, comprando do bom e do melhor, pagando sem discutir preços, topando barulhos sem discutir o porquê. Nas casas de rameiras, na Bahia, eram respeitados, temidos e ansiosamente esperados. E também nas casas exportadores de produtos para o interior os comerciantes de Ilhéus eram tratados com a maior consideração, tinham crédito ilimitado.

        De todo o Norte do Brasil descia gente para essas terras do Sul da Bahia. A fama corria, diziam que o dinheiro rodava na rua, que ninguém fazia caso em Ilhéus, de prata de dois mil-réis. Os navios chegavam entupidos de imigrantes, vinham aventureiros de toda espécie, mulheres de toda idade, para quem Ilhéus era a primeira ou a última esperança.

        Na cidade todos se misturavam, o pobre de hoje podia ser o rico de amanhã, o tropeiro de agora poderia ter amanhã uma grande fazenda de cacau, o trabalhador que não sabia ler poderia ser um dia chefe político respeitado. Citavam-se os exemplos e citava-se sempre a Horácio que começara tropeiro e agora era dos maiores fazendeiros da zona, e o rico de hoje poderia ser o pobre de amanhã se um mais rico, junto com um advogado, fizesse um “caxixe” bem feito e tomasse sua terra. E todos os vivos de hoje poderiam amanhã estar mortos na rua, com uma bala no peito. Por cima da justiça, do juiz e do promotor, do júri de cidadãos, estava a lei do gatilho, última instância da justiça em Ilhéus.

Jorge Amado. Terras do sem-fim. 54. ed. Rio de Janeiro, Record, s.d. p. 188-9.

Fonte: livro Língua e Literatura – Faraco & Moura – vol. 3 – 2º grau – Edição reformulada 9ª edição – Editora Ática – São Paulo – SP. p. 163-4.

Entendendo o conto:

01 – De acordo com o texto, qual o significado das palavras abaixo:

·        Grapiúna: na Bahia, apelido que os sertanejos dão aos moradores da capital ou de Ilhéus.

·        Rameira: prostituta.

·        Caxixe: negociata feita em torno de terras produtoras de cacau; logro.

02 – Qual é a principal atividade econômica de Ilhéus e como ela influencia a vida da cidade?

      A principal atividade econômica é a produção de cacau, que permeia todos os aspectos da vida da cidade, desde a economia até a cultura local.

03 – Qual é a atmosfera que predomina em Ilhéus? Justifique sua resposta com exemplos do texto.

      A atmosfera de Ilhéus é marcada pela violência, pela ambição e pela constante transformação. A presença de armas, a luta pelo poder e a rápida ascensão e queda social dos personagens ilustram essa atmosfera.

04 – Qual é o perfil dos habitantes de Ilhéus? São pessoas nativas da região ou vindas de outros lugares?

      A população de Ilhéus é bastante heterogênea, com muitos imigrantes vindos de outras regiões do Brasil em busca de oportunidades. A cidade é um caldeirão cultural, onde se misturam diferentes origens e histórias.

05 – Como os habitantes de Ilhéus se relacionam entre si? Há muita união ou a competição é acentuada?

      As relações entre os habitantes de Ilhéus são marcadas pela competição e pela violência. A busca por poder e riqueza gera conflitos e rivalidades.

06 – Qual é o papel da lei e da justiça em Ilhéus?

      A lei e a justiça formal têm pouco poder em Ilhéus. A violência e a força bruta são frequentemente utilizadas para resolver conflitos, e a lei do mais forte prevalece.

07 – Como a autora descreve a ascensão e queda social em Ilhéus?

      A ascensão e queda social em Ilhéus são rápidas e imprevisíveis. A riqueza pode ser adquirida de forma rápida, mas também pode ser perdida da mesma forma.

08 – Que tipo de linguagem Jorge Amado utiliza para descrever Ilhéus e seus habitantes?

      Jorge Amado utiliza uma linguagem rica em detalhes e vívida, capaz de transmitir a atmosfera da cidade e a complexidade de seus personagens.

09 – Quais são os principais temas abordados no fragmento?

      Os principais temas abordados são a violência, a desigualdade social, a busca por riqueza e poder, e a construção de uma nova sociedade no interior do Brasil.

10 – Com base neste fragmento, qual você acredita que seja o papel do cacau na história de Ilhéus?

      O cacau é o motor da economia de Ilhéus, gerando riqueza e atraindo pessoas de todas as partes do país. No entanto, ele também é responsável por muitos dos conflitos e da violência que marcam a cidade.

11 – Qual a sua impressão inicial sobre a obra "Terras do Sem-Fim" após ler este fragmento?

      Esta pergunta é aberta e permite que o leitor expresse sua própria opinião sobre a obra, com base nas informações presentes no fragmento.

 

 

 

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