CRÔNICA: Vocação
Walcyr
Carrasco
UMA DAS ATIVIDADES QUE mais deliciam os adultos é perguntar aos pimpolhos:
— O que você vai ser
quando crescer?
Entre meus amigos de
infância, a resposta padrão era médico ou advogado.
Algum, mais
aventureiro, respondia:
— Vou dirigir
caminhão!
Minha resposta era a
mais esquisita:
— Escritor.
Tinha me apaixonado
pela ideia de ser escritor, embora não soubesse bem do que se tratava.
— O que faz um
escritor? — perguntava minha mãe.
— Escreve! — eu
respondia, cheio de razão.
Ao longo da
adolescência, a crise explodia nos almoços de domingo:
— Vou prestar
bioquímica — avisava meu irmão mais velho.
Mamãe não sabia
exatamente do que se tratava, mas parecia respeitável.
Chegava minha vez:
— Quero ser
escritor.
— Do que vai viver?
Essa era a questão.
. Segundo todas as
informações, artistas em geral passavam fome.
— O certo é você ter
uma profissão e escrever nas horas vagas — aconselhava papai.
Eu teimava, dizendo que o dinheiro não era
importante. Mas a satisfação.
— Quero ver a
satisfação quando não tiver com que pagar o aluguel!
O almoço se tornava
um caos. Mamãe perguntava:
— Onde você estuda
para ser escritor?
Eu me calava.
Médicos, advogados, engenheiros, estudam em faculdades. Agora... escritores?
Como alguém se tornava um?
Tentava seguir o
conselho de Monteiro Lobato: ler bastante. Para escrever bem, é preciso ler
muito. Eu me afundava nos livros.
Um amigo de escola
me aconselhou:
— Só com bastante
experiência de vida. Como você vai falar sobre a vida dos outros se não passar
por tudo?
Sou do tipo tímido.
Seria obrigado a passar noites bebendo, até rolar pela sarjeta? Namorar uma
daquelas moças muito maquiadas, de saias bem curtas e botinhas de cano longo
que nos meus tempos passeava pela avenida São João? Sem dúvida, elas deviam ter
experiência de vida!
Talvez fosse melhor
fazer artesanato com couro. Deixei-crescer os cabelos, comprei couro, cola,
tesouras. A bolsa ficou pavorosa. Desisti.
Lá pelos vinte anos escrevi minhas primeiras peças. Mostrei a um intelectual.
— Está muito meloso.
Reli. Nada mais
pavoroso.
Comprei um livro de
culinária. Terminava a faculdade de jornalismo, mas precisava de algo para
expressar minha criatividade. Poderia montar um restaurante, se aprendesse
algumas receitas sofisticadas. Dediquei-me aos peixes com laranja, frangos com
laranja, arroz com laranja... as visitas, que só comiam de vez em quando,
adoravam. Eu não suportava mais olhar para uma laranja. Voltei para as
omeletes, macarrão... e ao sonho de ser escritor.
Meu primeiro livro
saiu a fórceps. Foi um infantil, Quando Meu Irmãozinho Nasceu, que conta a
história de um menino que acompanha a gravidez da mãe. Demorou mais ainda para
ser editado. Montar a primeira peça foi bem mais difícil, por causa do
dinheiro. Meu Terceiro Beijo acabou fazendo certo sucesso.
Acabei descobrindo
que a velha máxima é correta. Para subir uma escada é preciso um degrau de cada
vez. O mundo mudou. Agora existe um mercado para autores de livros, roteiristas
de cinema e televisão. Às vezes vou dar palestras em escolas e me perguntam
qual seria a carreira do futuro. Digo que não sei.
— Na minha juventude,
se alguém falasse em trabalhar com computadores, ia ser tachado de maluco —
explico.
Como será o mundo de
amanhã? O grande negócio é escolher o que se gosta. Quando a gente gosta do que
faz, pode ser até pavoroso. Mas insiste. Acaba aprendendo. Quando a gente
gosta, tem mais chance de dar certo. Foi isso que aprendi na vida. Foi assim
que me tornei escritor.
Entendendo o texto
01. O que mais delicia os adultos, segundo o autor?
a) Perguntar sobre profissões.
b) Comer em almoços de domingo.
c) Ler livros.
d) Beber café.
02. Qual era a resposta padrão entre os amigos de
infância do autor quando questionados sobre o que seriam quando crescessem?
a)
Escritor.
b) Dentista.
c) Médico ou advogado.
d)
Motorista de caminhão.
03. Como o autor definia a profissão de escritor
quando criança?
a)
Alguém que lê muito.
b) Alguém que escreve.
c)
Alguém que estuda em faculdades.
d)
Alguém que passa noites bebendo.
04. Qual era o
conselho do pai do autor sobre a escolha da profissão de escritor?
a) Dinheiro não é importante, apenas
a satisfação.
b) Ter uma profissão e escrever nas
horas vagas.
c) Estudar em faculdades renomadas.
d) Viajar pelo mundo em busca de
inspiração.
05. Como o autor tentou seguir o conselho de
Monteiro Lobato para se tornar um bom escritor?
a)
Fazendo artesanato com couro.
b)
Estudando jornalismo.
c) Lendo muito.
d)
Passando noites bebendo.
06. O que o amigo de escola aconselhou o autor
sobre ser escritor?
a) Beber muito e rolar pela sarjeta.
b)
Fazer artesanato com couro.
c) Ter bastante experiência de vida.
d)
Montar um restaurante.
07. Qual foi a primeira crítica recebida pelo autor
em relação às suas peças escritas na juventude?
a) Estavam muito melosas.
b)
Eram muito realistas.
c)
Faltava criatividade.
d)
Eram muito curtas.
08. O que o autor tentou fazer para expressar sua
criatividade antes de se dedicar à escrita?
a) Montar um restaurante.
b)
Pintar quadros.
c)
Escrever poesias.
d)
Tocar música.
09. Qual foi o título do primeiro livro do autor?
a)
Meu Terceiro Beijo.
b) Quando Meu Irmãozinho Nasceu.
c) O
Sonho de Ser Escritor.
d)
Peças da Adolescência.
10. Como o autor descreve o caminho para alcançar o
sucesso na carreira escolhida?
a) É
preciso ter sorte desde o início.
b)
Subir uma escada de uma vez.
c) Um degrau de cada vez.
d)
Depender apenas da paixão pelo trabalho.
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