Conto: NENHUM, NENHUMA
JOÃO GUIMARÃES ROSA
No conto Nenhum, Nenhuma, a
indefinição do espaço se articula com a questão do tempo, na medida em que
todas as referências a espaços indefinidos misturam-se à memória perdida
que o narrador tenta recuperar; o que ele talvez resuma da seguinte
forma: As lembranças são outras distâncias….
A narrativa inicia com o
trecho: Dentro da casa-de-fazenda, achada, ao acaso de outras várias e
recomeçadas distâncias, passaram-se e passam, na retentiva da gente, irreversos
grandes fatos – reflexos, relâmpagos, lampejos – pesados em obscuridade.
A procura pelos fatos da infância que “passaram
e passam-se” constitui uma tentativa de descobrir uma verdade misteriosa e
inacessível, que se articule e modifique o presente, lançando novas luzes ao
futuro.
O narrador do conto narra em primeira
pessoa, com a cumplicidade explícita de sua memória, uma das personagens
principais dessa história, tentando também compreender os dilemas que envolvem
a aproximação da morte.
O narrador rosiano caminha como se
estivesse perdido no labirinto de suas lembranças, encontrando as saídas após
um árduo e doloroso esforço. Ao longo de sua odisseia, ele enfrenta a tensão
entre a memória e o esquecimento, no resgate do passado, que não retorna em sua
pureza original, mas é fruto de uma singular seleção dos fatos lembrados.
O narrador faz um enorme esforço de
memória, que tanto pode ser entendido com a recuperação de um sonho, ou uma
regressão psicanalítica ou até terapia de vidas passadas.
Tudo o que consegue relatar, de forma
nebulosa, imprecisa e fragmentada, é que está de visita em uma casa, em que
havia um moço e uma moça que se amavam. Havia também uma velha de idade tão
avançada que nem havia mais noção de como chegara
ali. Essa ideia é o motivo dos dois jovens não poderem ficar juntos, pois a
moça precisa cuidar dela.
Desfeito o relacionamento, o menino é
levado para sua casa pelo moço. O garoto vê o sofrimento do jovem. É um amor
forte. Chegando a sua casa, o pai fala do muro novo que está sendo construído.
A mãe está preocupada em ver se a roupa do
filho estava em ordem. O garoto, indignado, berra com os pais, dizendo que eles
não sabiam nada do amor, preocupados que estavam com questões tão
insignificantes. Percebeu que o pai e mãe se suportavam e tinham transformado
seu casamento em
um desastre confortável.
Do ponto de vista da composição, o
conto “Nenhum, nenhuma” apresenta dois eixos bem distintos: o passado
e o presente.
Portanto, relembrando: neste conto,
apresenta-se um narrador-personagem que se esforça em relembrar uma experiência
de sua infância, mas que não consegue compor integralmente todas as cenas, os
detalhes dessa vivência e, por isso, só tem contato
com elementos esgarçados de memória, o que cria uma atmosfera de imprecisão e de
incertezas, próprias de quem se esforça por recuperar momentos longínquos do passado.
Esse esforço determina dois planos na narrativa: o do passado (infância) e o do
presente (memória) que são diferenciados inclusive tipograficamente, no texto
impresso.
Quando criança, o Menino estivera
hospedado por vários dias numa fazenda e vira um casal de namorados ter que se
separar porque a moça não podia abandonar uma velhinha que parecia teimar em
viver, a despeito de sua velhice e doença. Observando
os olhares apaixonados desse casal, o garoto encanta-se com a beleza da moça, sentindo
até mesmo raiva e ciúmes do namorado. Aquele amor tão intenso que percebia no
jovem casal o fazia pensar que deveria ser perpetuado nas relações e não
abrandado
pelas tarefas diárias, como parecia ter ocorrido com o amor que outrora unira os
seus pais. Todas essas percepções contribuem para que o Menino descubra a
diversidade do sentimento amoroso, ampliando pela experiência o seu
conhecimento sobre a vida,
e promovem aprendizagem, amadurecimento.
Guimarães Rosa.
Entendendo o conto:
01 – Como o conto aborda a
relação entre memória e tempo?
O conto aborda a
relação entre memória e tempo ao mostrar o narrador tentando recuperar as
lembranças de sua infância, que se misturam à memória perdida, criando uma
atmosfera de imprecisão e incerteza.
02 – Qual é a situação central
que o narrador relembra da sua infância?
O narrador
relembra a situação em que ele estava hospedado em uma fazenda e observou um
casal de namorados que teve que se separar devido à obrigação de cuidar de uma
velha doente.
03 – Como o narrador reage ao
amor intenso observado no casal de namorados na fazenda?
O narrador se
encanta com o amor intenso do casal e sente raiva e ciúmes do namorado. Ele
reflete sobre a intensidade do amor e como isso contrasta com a apatia que ele
percebeu em seu próprio relacionamento de seus pais.
04 – Como o conto aborda a
dualidade entre passado e presente na narrativa?
O conto
diferencia o passado (infância) e o presente (memória) tipograficamente, mostrando
como o narrador se esforça para recuperar cenas e detalhes do passado, criando
uma atmosfera de imprecisão.
05 – Por que o casal de
namorados na fazenda não pode ficar junto?
O casal de
namorados na fazenda não pode ficar junto porque a moça não pode abandonar a
velhinha doente, que parece teimar em viver, apesar de sua velhice e doença.
06 – O que o narrador aprende
com a experiência do casal de namorados na fazenda?
O narrador
aprende a diversidade do sentimento amoroso e amplia seu conhecimento sobre a
vida ao observar o amor intenso do casal, o que o faz refletir sobre seu
próprio relacionamento e as tarefas diárias que podem abrandar o amor.
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