Crônica: Será o fim do cadeado do amor? – Fragmento
Marcelo Rubens Paiva
Numa das paisagens urbanas mais
deslumbrantes, fruto da engenharia humana, a Pont des Arts, de Paris, casais do
mundo todo resolveram intervir e prender cadeados em seu gradil, como
prova de amor.
Não amor à civilização, humanidade,
igualdade, fraternidade e liberdade.
Mas ao casinho, ao namorido, ao
parceiro, ao amante.
Trancavam um cadeado no beiral de ferro
trabalhado há séculos, da ponte construída no começo de 1800, e jogavam a chave
no Sena, esperando um amor duradouro.
Me lembro que a vi com meia dúzia de
cadeados. Fui a Paris umas quatro vezes (a trabalho) e acompanhei o crescimento
desordenado e exponencial desta aberração urbana, numa das minhas e de muitos
paisagens preferidas.
Paris é abarrotada de turistas.
É a cidade-luz, do romance, do
amor, das artes, o museu a céu aberto.
Prender cadeados numa obra de arte,
além de pretensioso, não ia dar certo.
Nem sei se funciona numa relação
amorosa se sustentar apenas com a tranca de um cadeado de bicicleta que custa
de dez a 50 euros.
Não deu: começou a abalar a estrutura
de 45 toneladas.
Finalmente, o gradil começou a ser retirado,
depois de meses de debate na Prefeitura.
Nem teve protestos. E sim
turistas, com suas câmeras.
[…]
Enquanto os apaixonados não encontrarem
formas mais sensatas de provar o amor, falta agora catar as estimadas 700 mil
chaves que estão no leito do Sena, que corre abaixo.
Daria para construir outra ponte com
elas.
PAIVA, Marcelo
Rubens. Publicado em: 3 jun. 2015. Disponível em: http://cultura.estadao.com.br/blogs/marcelo-rubens-paiva/sera-o-fim-do-cadeado-do-amor/. Acesso
em: 8 jan. 2016. (Fragmento).
Fonte: Língua Portuguesa – Se liga na
língua – Literatura, Produção de texto, Linguagem – 2 Ensino Médio – 1ª edição
– São Paulo, 2016 – Moderna – p. 348.
Entendendo a crônica:
01 – Segundo o texto, por
que os casais prendiam cadeados nessa ponte?
Porque, segundo a tradição, os cadeados
fechados na ponte eternizariam o relacionamento dos casais.
02 – Qual é a opinião do
autor sobre esse hábito? Cite palavras ou expressões que justifiquem a
resposta.
O autor não
concorda com essa tradição, que ele chama de “aberração urbana” e ato
“pretensioso”. O advérbio finalmente, usado para caracterizar a
ação de retirada, também indica crítica àquela prática.
03 – Releia o segundo e o
terceiro parágrafos do texto e explique a função argumentativa da contraposição
apresentada.
O terceiro
parágrafo descreve o tipo de relacionamento representado pelos cadeados na ponte
com termos que indicam superficialidade, o que mais se reforça quando esses
termos são confrontados com valores humanos atemporais e universais indicados
no segundo parágrafo, os quais estão firmemente associados à história da
França.
04 – Por que foi empregado
sinal indicativo de crase no segundo parágrafo? Seu uso é correto na introdução
de todos os complementos? Explique.
Sim. A
preposição a introduz os complementos do substantivo amor (civilização, humanidade, igualdade, fraternidade e liberdade)
e, uma vez que esses complementos são substantivos femininos, é correta a
sinalização de crase, válida para todos eles.
05 – Por que foi usada a
preposição a antes dos substantivos do terceiro parágrafo?
A palavra amor está
subentendida na oração desse parágrafo, porque já foi citada na oração do
parágrafo anterior, o que exige o emprego da preposição a antes dos
artigos masculinos.
06 – Justifique a ausência
do sinal indicativo de crase no a em
“Fui a Paris”.
O
substantivo Paris não admite o artigo feminino, por isso não há
crase.
07 – A troca
de Paris por França exigiria a indicação de crase?
Justifique.
Sim. O
substantivo França admite o artigo feminino, logo haveria contração
da preposição com o artigo.
08 – O articulista ressalva
que suas várias viagens a Paris ocorreram “a trabalho”. Na sua opinião, que
imagem ele constrói dele mesmo ao fazer essa ressalva?
Resposta pessoal
do aluno. Sugestão: Paris é considerada um local romântico e, por isso, a
ressalva pode formar a ideia de que o articulista é avesso a determinadas
manifestações afetivas, o que coincide com a opinião dele sobre a retirada dos
cadeados da ponte.
09 – Quais valores
semânticos podem ser atribuídos à preposição na expressão viagem a
trabalho? Por que não houve a indicação de crase?
Pode-se entender a
trabalho como uma expressão de causa ou de finalidade. Não há indicação de
crase porque o substantivo que vem depois da preposição é masculino.
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