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quinta-feira, 14 de abril de 2022

CRÔNICAS: BOTECOS - LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO - VARIEDADE LINGUÍSTICA - COM GABARITO

 Crônica: Botecos

              Luís Fernando Veríssimo

        [...]

        E tem a história do Nascimento, que um dia quase brigou com o garçom porque chegou na mesa, cumprimentou a turma, sentou, pediu um chope e depois disse:

        -- E traz aí uns piriris.

        -- O que? – disse o garçom.

        -- Uns piriris.

        -- Não tem.

        -- Como, não tem?

        -- “Piriris” que o senhor diz é…

        -- Por amor de Deus. O nome está dizendo. Piriris.

        -- Você quer dizer – sugeriu alguém, para acabar com o impasse – uns queijinhos, uns salaminhos…

        -- Coisas pra beliscar – completou o outro, mais científico.

        Mas o Nascimento, emburrado não disse mais nada. O garçom que entendesse como quisesse. O garçom, também emburrado, foi e voltou trazendo o chope e três pires. Com queijinhos, salaminhos e azeitonas. Durante alguns segundos, Nascimento e o garçom se olharam nos olhos. Finalmente o Nascimento deu um tapa na mesa e gritou:

        -- Você chama isso de piriris?

        E o garçom, no mesmo tom:

        -- Não. Você chama isso de piriris!

        Tiveram que acalmar os ânimos dos dois, a gerência trocou o garçom de mesa e o Nascimento ficou lamentando a incapacidade das pessoas de compreender as palavras mais claras. Por exemplo, “flunfa”. Não estava claro o que era flunfa? Todos na mesa se entreolharam. Não, não estava claro o que era flunfa.

        -- A palavra está dizendo – impacientou-se Nascimento. – Flunfa. Aquela sujeirinha que fica no umbigo. Pelo amor de Deus!

A mãe de Freud. Porto Alegre: L&PM, 1997. p. 61-2.

Fonte: Livro – PORTUGUÊS: Linguagens – Willian R. Cereja/Thereza C. Magalhães – 5ª Série – 2ª edição - Atual Editora – 2002 – p. 56-7.

Entendendo a crônica:

01 – O que Nascimento, personagem principal dessa história, tem de diferente dos outros amigos?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Tem um vocabulário próprio, onde ele acha que as pessoas tem obrigação de entender e saber o que significa.

02 – Afinal, o que você acha que Nascimento chamava de piriris?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: É possível que fossem azeitonas, salame e queijo, mas não naquela quantidade ou daquele tipo, ou com aquela apresentação.

03 – Você acha que Nascimento está tentando reformar o mundo?

      Resposta pessoal do aluno. Sugestão: Em parte sim, pois ele não aceita as regras da língua formal.

04 – Qual o resultado do procedimento da personagem?

      Nascimento se indispõe com as pessoas, cria mal-estar no ambiente, se mostra mal-educado e promove mal-entendidos. Pode-se dizer que esse resultado equivale à infelicidade dele perante os amigos.

05 – Suponha que o garçom e os amigos de Nascimento aprendessem com ele o significado das palavras piriris e flunfa. E depois começassem a usá-las no trabalho, com outros amigos, com os familiares, etc.

a)   O que aconteceria com essas palavras?

Elas se tornariam uma gíria e, com o tempo, se todos começassem a fala-las, talvez viessem a se integrar à língua.

b)   Então, conclua: As regras que a língua segue podem mudar?

Sim, as regras podem mudar. Apesar disso, a língua é viva e está em constante mudança, assim como as pessoas e a sociedade.

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