CRÔNICA: QUEM MATOU ABEL?
Alexandre Azevedo -- Alguém sabe me dizer quem matou
Abel?
A sala permanece em silêncio. Ninguém
se atreve a responder. O inspetor insiste na pergunta, agora dirigindo-se a um
aluno:
-- Pedrinho, quem matou Abel?
O Pedrinho, suando frio, responde:
-- Juro pro senhor que eu não fui.
Ando com esse canivete no bolso, mas é só pra apontar o lápis!
O inspetor, surpreso com a resposta
do aluno, dirige-se à professora:
-- Dona Marlene, a senhora ouviu o
que ele disse?
-- Ouvi sim senhor, seu Percival, mas
eu conheço o Pedrinho desde que nasceu. Se ele disse que não matou, é porque
não matou! Esse guri aí não mente, pode ter certeza.
Indignado, o inspetor sai da classe e
se encaminha à diretoria:
-- Dona Gertrudes, eu exijo uma
explicação!
A diretora, estranhando o
procedimento do inspetor, pergunta:
-- O que aconteceu, seu Percival?
-- Eu fui à sala da professora
Marlene e perguntei a um aluno quem é que tinha matado Abel. E sabe o que ele
respondeu? Que não tinha sido ele. E o pior de tudo é que a professora
concordou!
A diretora coloca a mão no ombro do
inspetor, tentando acalmá-lo:
-- Olha, inspetor, eu não conheço
muito bem o menino, mas, se a professora disse que não foi ele, o senhor pode
ficar tranquilo. E, no mais, aquele menino é uma criança, ele não faria uma
coisa dessas.
Enfurecido, o inspetor vai à
Secretaria de Educação. No gabinete do secretário, relata, tintim por tintim,
toda a história:
-- E foi isso que aconteceu. Dá pra
acreditar?
O secretário, abismado com o
acontecido, não quis acreditar:
-- O senhor tem certeza? É muito difícil
acreditar que uma criança tenha cometido tal crime! Talvez fosse melhor
entregar o caso à polícia. Tenho certeza de que o delegado tomará as
providências necessárias.
Desesperado, o inspetor invade a
sala do governador. Ele, por sua vez, ouve toda a história. No final, tenta tranquilizá-lo:
-- Pode ficar tranquilo, senhor
Percival. Nós acharemos o verdadeiro culpado. A justiça falha, mas não tarda!
Quero dizer, tarda, mas não falha! Pode ter certeza de que quem matou Abel será
punido, eu prometo!
O inspetor está agora totalmente
transtornado:
-- Pelo amor de Deus! Eu não posso
acreditar no que estou ouvindo!
Sem se preocupar com o local, ele
grita:
-- Caim e Abel eram filhos de Eva!
O senhor nunca leu a Bíblia?!
O governador, aliviado, dá uma bronca
no inspetor:
-- Ah! Está na Bíblia, é? Ora,
então já devem ter arquivado o processo! Eu tenho mais o que fazer, passar bem!
Alexandre Azevedo. O vendedor de queijos e
outras crônicas. São Paulo: Atual, 1991.
Fonte: Livro –
Português – 5ª série- Palavra Aberta- Isabel Cabral – São Paulo: Atual, 1995,
p. 89, 90 e 91.
Entendendo o texto
1. Vamos observar as personagens do texto.
a)
Quais
são as personagens que participam da história?
O inspetor escolar, a professora,
os alunos, a diretora, o secretário de Educação e o governador.
b)
Quem
é a personagem mais importante? Por quê?
O inspetor de alunos. A história
gira em torno dele.
c)
O
narrador também é personagem?
Não.
2. O inspetor escolar queria verificar o conhecimento geral dos alunos e ficou surpreso ao perceber que eles não conheciam a história de Caim e Abel.
a)
De
acordo com o texto, o que significa não conhecer essa história bíblica?
Significa que o conhecimento geral
dos alunos era péssimo.
b)
Apenas
os alunos não tinham bom conhecimento geral? Quem mais confundiu a morte de
Abel com um crime comum?
Não. A professora, a diretora, o
secretário de Educação e o governador.
c)
Podemos
afirmar que, utilizando o humor, o autor critica todos os que participam do
funcionamento das escolas? Retire dois trechos do texto que comprovem a sua
resposta.
Sim, pois ocorre o contrário do esperado: que as pessoas que se
relacionam às escolas tenham um bom conhecimento geral. “[...] se a professora
disse que não foi ele, o senhor pode ficar tranquilo” / “É muito difícil
acreditar que uma criança tenha cometido tal crime!”.
3. Todos os conhecimentos que temos são aprendidos na escola? Por quê?
Resposta
pessoal do aluno.
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